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Resolução sobre o uso de Psicadélicos do Colégio de Psiquiatria

No âmbito das suas competências, a Direção do Colégio de Especialidade de Psiquiatria da Ordem dos Médicos reafirma o seu compromisso com a utilização de práticas baseadas na melhor evidência científica e experiência clínica, que garantam a defesa do interesse e da saúde de todas as pessoas, em particular das que se encontram numa situação de vulnerabilidade acrescida por experienciarem uma doença mental. Atendendo à discussão pública em torno do uso de substâncias psicadélicas no tratamento de doenças mentais, a Direção do Colégio de Especialidade de Psiquiatria da Ordem dos Médicos entende oportuno afirmar que:

  1. A evidência sobre o potencial terapêutico de um psicadélico atípico – a cetamina (ou quetamina) – na depressão grave resistente aos tratamentos disponíveis e aprovados, tem vindo a ser desenvolvida, mas ainda não reúne robustez suficiente na eficácia e segurança para aprovação formal pelas agências internacionais e nacionais do medicamento.
  1. A cetamina está aprovada em Portugal como anestésico, e, por isso, tem uso off-label para quaisquer outras indicações, inclusive psiquiátricas. O seu consumo está igualmente associado ao uso ilícito como droga de abuso.
  1. O uso de cetamina deve fazer-se exclusivamente por prescrição de médico(a) com a habilitação e a especialização necessárias para o tratamento de depressão grave e resistente aos tratamentos convencionais, sendo mandatória a obtenção de um consentimento informado escrito, voluntário, livre e esclarecido que explicite os riscos e benefícios potenciais da sua utilização.
  1. Tratando-se de um tratamento off-label para a depressão grave e resistente, o uso da cetamina não deve ser promovido publicamente e não deve ser publicitada do ponto de vista comercial por médicos e/ou por clínicas. Os médicos psiquiatras que participem na utilização desta substância deverão subordinar-se à regulamentação ética e deontológica prevista no Regulamento n.º 707/2016 – Regulamento de Deontologia Médica, em particular nos seus Artigos 10º, 20º e 56º, publicado no Diário da República, 2.ª série – N.º 139 – 21 de julho de 2016.
  1. As psicoterapias associadas à utilização deste tipo de moléculas carecem de modelo teórico e conceptual, que tenha passado o escrutínio da evidência científica, e que permita a sua prescrição. Devemos distinguir estas psicoterapias da importância de haver um(a) profissional de saúde idóneo(a), experiente, e com formação em psicoterapia, que possa dar suporte antes e após as intervenções farmacológicas com substâncias capazes de alterar o estado de consciência.
  1. A comunicação pública acerca das psicoterapias assistidas por psicadélicos deve clarificar de forma inequívoca, explícita e cabal a inexistência de estudos robustos que garantam a eficácia e segurança necessárias para a aprovação da indicação clínica formal, sendo também necessário promover um profundo debate num contexto interdisciplinar.
  1. O uso de outras substâncias psicadélicas, nomeadamente psilocibina e MDMA, encontra-se vetado pelos normativos legais em vigor no território nacional, podendo apenas ser considerada a sua utilização em ensaios clínicos experimentais devidamente aprovados pelas entidades reguladoras.
  1. A investigação respeitante ao uso da psilocibina, na depressão grave e resistente, e do MDMA, na perturbação de stress pós-traumático, está ainda em fase de ensaios clínicos, ou seja, em estádio preliminar, para poderem ser aprovadas como seguras e eficazes pelas agências nacionais e internacionais do medicamento. Estas substâncias são, também, reconhecidas pelo uso ilícito como drogas capazes de alterar o estado de consciência, aumentando a vulnerabilidade à sugestão dos seus consumidores.
  1. Finalmente, o uso responsável dos medicamentos e tratamentos em Psiquiatria deve garantir a segurança e a sua farmacovigilância, na dosagem e indicação adequadas a cada doente, com o menor custo possível e a maior acessibilidade em termos de sistema de saúde.

3 | agosto | 2023

A Direção do Colégio da Especialidade de Psiquiatria

Download em PDF: CEP-2023-R-02 Psicadélicos