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Parecer sobre o PNV para 2012

Relativamente ao documento “Programa Nacional de Vacinação para 2012” enviado a este Colégio para apreciação, considera-se que constitui um excelente trabalho, adequado aos objectivos na população portuguesa. No entanto, consideram-se de enorme relevância os seguintes aspectos, em consonância com o actual conhecimento científico.

1. Intervalo entre administrações de vacinas diferentes

a. Na intervenção profilática vacinal com resposta humoral de imunoglobulinas, pretende-se a indução de clones linfocitários B de memória, para que a eficácia esperada possa decorrer num intervalo temporal conveniente.

b. A anticorpopoiese específica necessita de uma regulação genica, capaz de indução de mRNAs codificadores dessa imunoglobulina específica, imunocompetente.

c. A semi-vida das imunoglobulinas humanas varia em função do tipo e da classe (IgG1, IgG2, IgG4 de 23 dias; IgM de 5 dias).

d. A bem reconhecida imaturidade do sistema imunitário, em idades precoces, traduzida pela tão frequente imunodeficiência transitória da criança, traduz a dificuldade, objectiva, de uma eficiência de uma resposta imunológica de memória. Salienta-se, ainda, que estes aspectos estão bem patentes e demonstrados na biologia da celularidade da medula óssea nos primeiros 18 meses de vida.

e. Na maturação linfocitária B são, ainda, requeridos factores de crescimento extra-medulares, como por exemplo os dependentes do metabolismo tímico que cursam em paralelo ao processo de maturação linfocitário T.

f. Como se depreende, uma estimulação intempestiva, apesar dos objectivos claramente preventivos (vacinais), pode comprometendo a indução de clones celulares específicos e de memória e reduzir a eficácia imunológica na resposta de anticorpos e/ou celular.

Assim, apesar, da evidência da eficácia da manipulação preventiva e da redução de custos directos e indirectos na administração simultânea de vários extractos vacinais, tal como subscrito na página 20, Quadro VI, sempre que possível deveria ser efectuada uma administração desfasada temporalmente, atendendo ao tipo de resposta imune esperada.

i. Schroeder HW, Cavacini L. Structure and function of immunoglobulins J Allergy Clin Immunol 2010; 125 (Suppl 2): S41-S52.

ii. Vikstrom I, Tarlinton DM. B cell memory and the role of apoptosis in its formation. Mol Immunol. 2011;48:1301-6.

iii. Rankin AL, MacLeod H, Keegan S, et al. IL-21 receptor is critical for the development of memory B cell responses. J Immunol. 2011;186:667-74.

 

2. Reacções adversas

a. Relativamente às reacções adversas a vacinas, particularmente as reportadas a reacções alérgicas, remete-se, em anexo, artigo de revisão elaborado por Colegas Imunoalergologistas, como título “Reacções alérgicas a vacinas”.

b. Em crianças ou adultos com prévia documentação de anafilaxia a alguns dos constituintes presentes em qualquer das vacinas, o documento em apreço deve, de forma clara, indicar a necessidade absoluta de encaminhamento para Serviço de Imunoalergologia, o qual terá de obrigatoriamente, de efectuar um atendimento prioritário.

Assim, o pressuposto inscrito na página 45 “Uma história de reacção anafiláctica ao ovo não implica uma reacção anafiláctica às vacinas produzidas em culturas celulares de embrião de galinha, como é o caso das vacinas VASPR. Nestes casos, apesar de uma reacção anafiláctica ser improvável, recomenda-se que a vacina seja administrada em meio hospitalar.” está em dissonância com a boa Praxis Medica.

c. Nestas situações não é admissível proceder à administração do extracto vacinal num ambiente de cuidados primários de saúde, sem profissionais altamente treinados e diferenciados no manejo destas situações.

d. Serviços Hospitalares de referência devem ter disponíveis extractos vacinais hipoalergénicos, por exemplo isentos de timerosal para doentes com demonstrada hipersensibilidade grave a este conservante.

 

3. Vacinação em considerações especiais

a. Relativamente aos doentes com alterações/disfunções imunitárias, particularmente nas imunodeficiências primárias, o documento deve indicar, claramente, a obrigatoriedade de referenciação para um Serviço Hospitalar altamente diferenciado que assegure o conveniente acompanhamento e possa aferir da oportunidade do procedimento.

b. Salienta-se que nos indivíduos com imunodeficiência na produção de anticorpos, como na hipogamaglobulinémia variável comum ou a agamaglobulinémia ligada ao X, uma das metodologias de diagnóstico é a confirmação da ausência de anticorpos específicos após uma inoculação vacinal de toxóide diftérico ou tetânico, pelo que a vacinação é ineficaz.

 

i. de Vries E, Driessen G. Educational paper: Primary immunodeficiencies in children: a diagnostic challenge. Eur J Pediatr. 2011;17:169-77

ii. http://www.spaic.pt/grupos/?imr=10&fmo=ver&grupo=66

 

Celso Pereira

Presidente do Colégio de Imunoalergologia