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Ordem rejeita instrumentalização dos médicos de família

A Ordem dos Médicos tem recebido informações de vários médicos e de doentes sobre as dificuldades a que se assiste no acesso aos centros de saúde por parte dos chamados doentes não-Covid, fruto de uma estratégia política que centralizou uma grande parte do trabalho dos médicos de família nas tarefas relacionadas com a pandemia. Recorde-se que mesmo antes deste surto, os médicos de família já tinham uma lista excessiva de 1900 doentes para acompanhar, a que se somam cerca de 1 milhão de portugueses sem médico de família atribuído, para além do excesso de tarefas burocráticas.
A Ordem dos Médicos reconhece o trabalho de excelência que os médicos de família têm feito no acompanhamento dos doentes com Covid-19, mas rejeita que se continue a fazer uma instrumentalização destes mesmos clínicos. Não podemos colocar nos médicos de família o ónus de conseguirem uma boa resposta à pandemia, deixando, simultaneamente, que recaia sobre esses mesmos médicos o descontentamento dos seus doentes de sempre. Os mesmos médicos não conseguem ao mesmo tempo dar resposta aos doentes Covid-19 e aos doentes não-Covid.
Aliás, as dificuldades no acesso aos centros de saúde começam em problemas antigos e basilares, agravados pelo recurso ao telefone em tempos de pandemia, com as centrais telefónicas dos centros de saúde a não suportarem várias chamadas em simultâneo e passar-se a ideia de que o telefone toca e ninguém atende.
Os médicos de família querem consultar os seus doentes e dar continuidade à vigilância dos doentes crónicos para que não se percam os ganhos em saúde que o controlo das doenças crónicas permitiu ao longo dos últimos anos. Esta missão, em grande parte impedida pelo Ministério da Saúde, ao continuar a concentrar a atividade de muitos médicos de família no combate à pandemia (áreas dedicadas a Covid-19, Trace-Covid, lares, StayAway-Covid…), tem de ser recuperada.
O Ministério da Saúde tem a obrigação ética, e o dever perante os portugueses, de libertar os médicos de família para exercerem assuasfunções e tarefas habituais. Os nossos doentes de sempre não podem continuar a ser prejudicados. É possível e desejável criar equipas e linhas diretas próprias para responder às necessidades dos doentes Covid-19 que não precisam de estar internados em meio hospitalar. Se necessário recorrendo a todo o sistema de saúde. A Ordem dos Médicos deixa este apelo ao Ministério da Saúde, no sentido de que sejam criadas condições para que médicos e utentes possam voltar à normalidade do exercício da medicina, respeitando a relação médico-doente e as necessidades de saúde da população.

 

Lisboa, 30 de setembro de 2020

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