O Ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior mostrou esta semana, numa entrevista, a intenção de abrir mais três cursos de medicina nos próximos anos, apresentando-se este caminho como solução para uma pretensa falta de médicos em Portugal. O bastonário da Ordem dos Médicos lembrou, entretanto, que o problema não está na falta de médicos formados nas universidades, mas sim na incapacidade em reter estes profissionais no Serviço Nacional de Saúde. Além disso, Miguel Guimarães considera que não há massa crítica suficiente no país para a abertura de mais três cursos.

O bastonário, em declarações à RTP, afirmou que o essencial é “manter a boa qualidade naquilo que é a formação dos médicos”. “É fundamental investir mais nos cursos de medicina que já existem, para melhorar a qualidade da formação”, em vez de apostar numa quantidade que não seria benéfica. O bastonário referiu que para haver uma escola médica “é preciso ter condições para que ela possa funcionar” em pleno. “A primeira condição é a questão do ensino prático e do ‘hospital-mãe’ que a escola médica tem que ter”. A narrativa da falta de médicos no país é falsa, tal como os números comprovam. “Somos o terceiro país da OCDE que mais médicos forma por mil habitantes (…) e somos o oitavo país da Europa que mais estudantes de medicina tem por 100 mil habitantes”, disse o representante dos médicos.

O problema que o SNS atravessa é de fixação dos profissionais. “Temos de analisar porque é que os médicos não ocupam as vagas todas que são abertas nos hospitais e nos centros de saúde e tentar motivar as pessoas para escolherem ficar a trabalhar no SNS”. 

O ministro Manuel Heitor defendeu também uma redução no tempo de formação dos médicos, em particular nos médicos de família, representando este nivelar por baixo um ataque direto à qualidade dos cuidados de saúde que os médicos dão aos seus doentes. Tal como o bastonário relembrou, Portugal já é dos países que mais forma especialistas em Medicina Geral e Familiar, num percurso de grande exigência e qualidade que é essencial na principal porta de entrada no SNS. “O problema é que não temos conseguido ficar com eles dentro do SNS”. Muitas das razões são já conhecidas, mas a Ordem dos Médicos, para efeitos de sistematização, está a conduzir um inquérito para procurar mais informação que nos diga os motivos concretos que fazem os profissionais optar por sair do setor público para o setor privado ou até mesmo para o estrangeiro.

É a formação de qualidade dos médicos e o capital humano do SNS que permite que tenhamos “um dos melhores serviços públicos de saúde do mundo”, reiterou Miguel Guimarães. Atacar essa qualidade seria um erro crasso. “Não queremos fazer um downgrade, nem termos médicos de primeira e de segunda categoria”. “Queremos tratar os doentes todos da mesma maneira e da melhor forma possível (…) é a qualidade da formação aquilo que nos tem distinguido ao longo destes anos”, terminou.

O presidente do Conselho de Escolas Médicas Portuguesas, Henrique Carvalho, também já reagiu à notícia, afirmando que não se justifica a abertura de mais cursos de medicina.