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Eutanásia, Constituição e Deontologia Médica em debate na OM

A propósito do lançamento de “Eutanásia, Constituição e Deontologia Médica”, um livro da AAFDL Editora, da autoria de Paulo Otero, a Ordem dos Médicos organizou no dia 18 de fevereiro um participado debate subordinado a esta temática. Miguel Guimarães, bastonário da OM, que presidiu à sessão, realçou na sua intervenção que mesmo quem defende a legalização da eutanásia tem severas críticas aos projetos de lei que foram votados em Assembleia da República no dia 20 de fevereiro de 2020.

O bastonário da OM explicou ainda que os projetos de lei nesta matéria fazem “pesar” sobre os médicos, perante o pedido de um doente, a decisão de confirmação se é ou não aplicável a eutanásia, tendo como um dos determinantes dessa decisão um conceito tão subjetivo como o “sofrimento insuportável”. Miguel Guimarães lamentou que se vá fazer uma votação na Assembleia da República sem que tenha havido debate suficiente e consequente com a sociedade civil e recordou que o único organismo que fez um trabalho de ampla discussão pública nessa área foi o Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida que organizou em 2017 um ciclo de debates que percorreu o país, intitulado “decidir sobre o final da vida”.

Realçando a necessidade de maior informação e debate, Miguel Guimarães recordou que as pessoas ainda nem sequer distinguem devidamente os conceitos de eutanásia (antecipação da morte a pedido do doente) e distanásia (prolongamento da vida, resultante de obstinação terapêutica e que consubstancia má prática médica), lamentando que esse desconhecimento e confusão de conceitos exista também nos jornalistas…

Paulo Otero, por seu lado, resumiu o conteúdo do seu livro, a três questões:

  • É a eutanásia conforme com a Constituição?
  • Pode o médico ministrar a dose letal mesmo a pedido do doente?
  • Pode a lei obrigar à mudança do código deontológico de uma ordem profissional?

Referindo, entre outros argumentos, a inviolabilidade da vida e o compromisso dos médicos com a vida, Paulo Otero responde negativamente às três questões.

O debate contou ainda com a intervenção do psiquiatra Pedro Afonso que defende que não podem continuar a existir listas de espera para cuidados paliativos, sendo dever do Estado proporcionar cuidados adequados e suficientes nessa área, frisando que “a vida humana nunca perde valor independentemente das circunstâncias” e que “a vida não é descartável”; Já o neurologista Bruno Maia, realçando o interesse destas questões, o que ficou bem demonstrado numa plateia de mais de 200 pessoas que encheram o auditório da Ordem dos Médicos, defendeu que a vida e outros direitos fundamentais não são referendáveis e lembrou que o consenso que existe neste tema “é que não há consenso e que os médicos estão divididos”.

Da plateia, várias intervenções enriqueceram o debate e uma em particular veio demonstrar a forma algo precipitada como se avançou para a votação de projetos de lei: Alexandre Guedes da Silva, presidente da SPEM – Sociedade Portuguesa de Esclerose Múltipla, começou por agradecer o convite do Bastonário da Ordem dos Médicos para que a SPEM participasse neste debate e, em seguida, lançou a pergunta para a plateia: “e os doentes, o que pensam?”, questionando se alguém saberá responder pois “nenhum deputado foi ouvir a nossa opinião”, nem pró, nem contra a legalização da eutanásia. “Vão decidir sobre os doentes, sem nos ouvir!”, lamentou, frisando que “gostaria de saber se há uma folha de excel que está por trás da preocupações dos deputados”… Já após o debate, antes de abandonar o anfiteatro da Ordem dos Médicos, Alexandre Guedes da Silva deixa a sua posição bem clara: “Vida, sempre a vida!”