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Ecos do congresso | Carlos Cortes (presidente executivo do congresso)

 

Fez um discurso humanista e centrado na solidariedade demonstrada na pandemia, mas também já antes disso. Falou na desvalorização da pessoa, numa certa desumanização a que temos assistido. O que o leva a dizer isto e qual é o papel dos médicos para evitar que isto aconteça?

Nós estamos numa sociedade muito frenética, o tempo passa muito depressa, os acontecimentos sucedem-se, por força do mundo globalizado como nós o temos, numa sociedade de informação rápida. As telecomunicações evoluíram muito nestas últimas décadas e as novas tecnologias invadem – e bem – os cuidados de saúde. Ajudam os médicos no seu trabalho, mas tem-se perdido muito nos últimos anos o fator humano, o fator pessoa, as relações entre as pessoas, os princípios hipocráticos da relação médico-doente, do apoio ao doente, de uma espécie de compaixão… Referia-me a esse tipo de relação, mas referia-me também a uma relação entre as pessoas, independentemente de serem médicos ou não serem médicos. Os médicos têm essa vocação humanista que advém de vários milénios de pensamento sobre a medicina, e é precisamente aquela profissão que pode conseguir dar a volta a isto.

Que diferenças trouxe a pandemia a esta questão?

Estamos num período pandémico, em que o vírus carregou muito neste individualismo que tem de acabar. As pessoas fecham-se sobre si próprias e a sua preocupação, em termos de saúde, tende a ser consigo próprias, porque o seu problema de saúde não interfere com os outros e o dos outros não interfere com o seu. Percebemos agora que o mundo está muito interligado, que precisa de respostas integradas, e que temos de trabalhar todos numa espécie de comunidade global, solidários, respeitando valores de humanismo, de equidade, de igualdade, de entreajuda. Esta é efetivamente a resposta e os médicos podem transportar esta mensagem. Nós, pessoas, deixamo-nos seduzir pelas novas tecnologias e esquecemo-nos do valor da pessoa. É o momento de focarmos o valor da pessoa, é o momento de tomar o tempo, de dar o tempo, e de as pessoas voltarem a estar juntas, com o olhar e com o toque. É por isso que este congresso é um encontro e um reencontro das pessoas, mesmo respeitando as normas da DGS.

Foram quatro dias de congresso que tiveram duas dimensões que são pioneiras. A primeira é a acreditação por parte da UEMS e a segunda é a dimensão científica através das sessões dos Colégios. Como presidente executivo deste congresso sente que a missão está cumprida?

Quisemos dar uma nova fórmula ao congresso, para despertar um interesse diferente junto das pessoas. É uma acreditação que espelha um conteúdo científico muito pronunciado e foi muito simples fazê-lo. Utilizámos os recursos da Ordem dos Médicos e convidámos os Colégios para apresentar a atualidade científica do momento e responderam de forma absolutamente notável, conferindo a este congresso esta vertente muito científica. Mas não foi a única. Houve outras vertentes, como a vertente social, política, económica, de gestão, de formação médica… entre outras que vimos nas várias mesas, com o pano de fundo do humanismo e da ética, que nunca perdemos de vista durante estes quatro dias.

Que mensagem final deixa aos médicos, tanto para os que acompanharam o congresso como no geral?

A primeira coisa é uma mensagem de orgulho. De orgulho pelo contributo que os médicos dão, e sempre deram, em fases extremamente difíceis como a desta crise pandémica, estando sempre ao serviço das pessoas. E o desafio que eu lanço, o pedido que eu faço, é voltarmos ao humanismo médico, de nos voltarmos a concentrar, a preocupar e a refletir sobre o nosso papel numa sociedade que está em desumanização. É mais uma responsabilidade dos médicos darmos a volta a esta realidade.