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“A evolução da ciência é mais forte que a política” – Miguel Guimarães, na cerimónia de tomada de posse

Miguel Guimarães foi reeleito com o apoio da quase totalidade dos votos expressos nestas eleições. “Os médicos deram um sinal importante à sociedade civil, aos decisores políticos e ao poder económico de que estão preocupados com a Saúde dos portugueses e com o seu próprio futuro; que estão cientes dos desafios que se colocam à profissão; que querem ter uma voz ativa nas matérias que interferem com a qualidade da medicina e a segurança clínica, e que não ignoram a relevância social, política e institucional que a Ordem representa”, referiria no seu discurso de tomada de posse, enaltecendo a elevada participação dos médicos nesta eleição.

Miguel Guimarães tomou posse no dia 5 de fevereiro, numa cerimónia em que participaram cerca de 350 pessoas, entre as quais realçamos, além de centenas de médicos, a Ministra da Saúde, Marta Temido, vários deputados, o vice-presidente da Assembleia da República, bastonários e ex-bastonários, o reitor da Universidade do Porto e outros representantes de faculdades de medicina, ex-ministros da saúde, e tantas outras personalidades que se quiseram associar a esta cerimónia.

Na sua intervenção, Marta Temido recordou o papel da OM na defesa da ética e da deontologia médicas, e as suas amplas atribuições, das quais salientou a regulação da profissão, o exercício do poder disciplinar, e a colaboração com a administração pública. Reconhecendo que quer os médicos quer a Ordem que os representa, tem especial relevância no desempenho do SNS, afirmou: “foram os profissionais que construíram o SNS e é com eles que o SNS conta todos os dias”. A Ministra da Saúde falou ainda sobre as “características únicas” que definem a relação médico-doente e, a propósito dos casos de violência de que têm sido alvo vários profissionais, considerou necessário “trabalhar numa mudança cultural”, afirmando que o Ministério “fará tudo o que estiver ao seu alcance para erradicar a violência”.

Em seguida, tomou a palavra o ex-bastonário Carlos Ribeiro, mandatário da candidatura de Miguel Guimarães, que enalteceu o facto desta ter sido a mais concorrida de todas as eleições para a OM, mesmo havendo um candidato único a bastonário, o que, referiu, demonstra que a maior parte dos médicos confia no seu representante. Sobre Miguel Guimarães lembrou ser um profissional com um currículo excelente, um “profissional dedicado, (…) defensor do SNS, clínico sério e perspicaz, (…) comunicador de excelência, investigador inovador” que sempre soube incentivar os mais jovens. Realçou ainda a bem elaborada proposta eleitoral, e o compromisso do bastonário agora reeleito para maximizar as qualificações dos médicos, apontar novos caminhos para uma política de saúde centrada no doente, promover e defender a relação médico-doente, revitalizar as carreiras médicas e defender o ato médico. Carlos Ribeiro alertou que, com falta de profissionais, ausência de renovação e diminuição de apoio político e financeiro, “o SNS está a definhar”, apresentando tempos de espera inaceitáveis, sob o que qualificou como a “ditadura da informática”, com disfunção de sistemas e exigências desmedidas dos administradores. Tudo fatores que concorrem para a “debandada” dos profissionais e, “os que ficam são muitas vezes agredidos física e psicologicamente”. Centrando-se no tema da violência, o Carlos Ribeiro apelou a processos judiciais agilizados e mais segurança, pois “não chegam comunicados insípidos”, para resolver a violência, frisou, num apelo à ação consequente por parte da tutela. Regressando ao tema central da sua intervenção, o ex-bastonário enalteceu igualmente o compromisso de Miguel Guimarães em cuidar do direito dos profissionais à formação profissional contínua e em lutar pela humanização do ato médico. Defensor de maior liberdade para os médicos na gestão da sua agenda e de maior apoio administrativo para diminuir a carga burocrática a que estão sujeitos, Carlos Ribeiro fez ainda a apologia da defesa de condições adequadas “para que o médico não enverede por uma medicina defensiva e eticamente condenável”, com o ato médico no centro de todos os processos decisórios em saúde, saudando a iniciativa do bastonário em procurar elevar a relação médico-doente a património imaterial da humanidade. “Miguel Guimarães é o timoneiro certo para transmitir coragem e dedicação nesta fase de grandes desafios”, declarou, referindo acreditar que através do êxito da atuação do bastonário agora reeleito se impulsionará a medicina portuguesa.

O bastonário Miguel Guimarães, após os agradecimentos, sublinhou a “honra e o privilégio” que sente “ao reconquistar a liderança da Ordem dos Médicos” assim como o “enorme sentido de responsabilidade resultante de uma expressiva vontade manifestada pelos médicos portugueses, naquela que foi a maior participação de sempre em eleições da OM, com 93% dos médicos a renovarem a sua confiança no meu mandato”. Ciente que o trabalho deste novo triénio “é ainda mais árduo e de uma enorme exigência”, o Miguel Guimarães agradeceu a confiança dos milhares de colegas que o reelegeram, explicando que essa votação massiva é um importante sinal de que os médicos não aceitam permanecer em silêncio quando estão em causa “os nossos doentes, a nossa dignidade profissional e até a nossa integridade física, como recentemente se percebeu com a lamentável sucessão de agressões”, e deixou “uma palavra de respeito, afeto e solidariedade para com todos os colegas que estão na linha da frente e que continuam a dar a cara pelo nosso serviço público de saúde, a servir os portugueses, mesmo nas condições adversas que o SNS atravessa atualmente: Muito obrigado e bem hajam”. Sobre a violência, referiu ainda ser necessário uma análise profunda em que se determinem e eliminem as causas e garantiu que a Ordem continuará “o trabalho desenvolvido através do gabinete nacional de apoio ao médico vítima de burnout, violência física ou psicológica, assédio moral ou sofrimento ético”. Com um programa ambicioso, Miguel Guimarães deixou claras as suas prioridades ao explicar que a ética, a relação médico-doente, a formação e a qualidade da medicina serão novamente a base de toda a sua atuação.  “Podem contar com uma OM forte e comprometida com o bem comum, que não escolhe o caminho mais fácil por ser o politicamente correto ou dominante”, assegurou. Apesar de ser um dia de celebração, o bastonário eleito não pôde esconder o seu lamento pela influência negativa da falsa informação ou pelo facto de – sob a ditadura das finanças equilibradas – se pôr tantas vezes “completamente de lado a economia da qualidade de vida, a economia da Saúde”. “Não posso deixar de recordar e condenar a consagração das terapêuticas sem evidência científica na nova Lei de Bases da Saúde, ao mesmo tempo que o ato médico foi eliminado dessa mesma lei. O nosso legislador e poder político preferiram a valorização da pseudociência em detrimento da verdadeira ciência suportada pelo método científico… Um verdadeiro retrocesso civilizacional e científico, que só não vai acontecer porque a evolução da ciência é mais forte que a política. E os políticos precisam da ciência, pelo menos quando estão doentes”, referiu sob um forte aplauso da plateia. “Como médico português tenho vergonha que tal tenha acontecido. O legislador e o poder político não acautelaram o superior interesse dos cidadãos”. A concluir, Miguel Guimarães deixou vários desafios à Ministra da Saúde, instando-a a:

– “em nome do interesse nacional, criar condições para que os nossos jovens fiquem a trabalhar no SNS, mediante um projeto de trabalho que seja aliciante. “Portugal é um país envelhecido. Não podemos deixar o SNS envelhecer com ele”;

– “devolver equidade ao SNS” pois, embora sejamos um país pequeno, existem muitas desigualdades;

– “encontrar solução justa e eficaz para que os nossos doentes não esperem e desesperem nas listas de espera” para cirurgia e primeiras consultas.

Miguel Guimarães – que citou Carlos Ribeiro ao lembrar que tudo começa com o ato médico, momento que consiste na comunicação entre dois seres sem interferência de terceiros – estabeleceu assim um desafio à tutela por cada ano do seu novo mandato, garantindo que a Ordem dos Médicos também está naturalmente disponível para ajudar nestes desafios.

Nesta cerimónia, tempo ainda para a mensagem do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que não podendo estar presente, fez questão de gravar um vídeo para felicitar o bastonário recém-reeleito, no qual sublinhou que “tem tomado devida nota” das preocupações, reivindicações, expectativas e sonhos dos médicos. “Espero que este futuro próximo possa ser melhor para a saúde em Portugal. É o que desejo como presidente e como cidadão”, elucidou, “o que só será possível, contando com o vosso contributo essencial”.

Discurso do bastonário da Ordem dos Médicos na cerimónia de tomada de posse de 5 de fevereiro de 2020: Discurso tomada posse 2020-02-05