Foi publicada em 9 de fevereiro a Portaria 45/2018 que regula os requisitos gerais que devem ser satisfeitos pelo ciclo de estudos conducente ao grau de licenciado em Medicina Tradicional Chinesa (MTC) que venham a ser criados.
No âmbito das suas atribuições, compete à Ordem dos Médicos contribuir para a defesa da saúde dos cidadãos e dos direitos dos doentes, pelo que não podemos deixar de salientar que o referido ciclo de estudos não habilitará à prática de Medicina, que é exclusiva dos Médicos.
A consagração deste ciclo de estudos é o culminar de um processo que sempre mereceu e continuará a merecer a oposição da Ordem dos Médicos quer pela forma como foi conduzido, quer pelas soluções adotadas.
Não podemos deixar de realçar que um jovem médico, em Portugal, tem uma formação pré-graduada exclusivamente universitária de 12 semestres curriculares correspondente a 360 unidades de crédito ao qual se segue a formação pós-graduada para habilitação ao exercício autónomo e especializado da Medicina que, em algumas especialidades, chega a durar 7 anos.
Reiterando que todas as intervenções terapêuticas com resultados efetivos e comprovados cientificamente são incorporadas na Medicina convencional, a criação de ciclo de estudos com formação de 8 semestres curriculares em práticas que não têm base científica comprovada, constitui um perigo para a Saúde e para as finanças dos portugueses pois poderá gerar atrasos em diagnósticos e tratamentos de situações potencialmente graves que, assim, continuarão a evoluir.
Mais uma vez a Ordem dos Médicos lamenta que o legislador tenha cedido aos interesses comerciais e publicitários, apelidando este ciclo de estudos de Medicina Tradicional Chinesa, dando azo a que surjam equívocos quanto à componente (inexistente) de formação Médica.
A Ordem dos Médicos já tinha em 2013 manifestado em sede Parlamentar e em ofício dirigido ao Presidente da República que a expressão “Medicina tradicional chinesa” fosse substituída por “Terapêuticas tradicionais chinesas” a propósito da proposta de Lei 111/XII.
As práticas ou terapêuticas tradicionais chinesas não constituem prática médica e, em defesa da verdade, da transparência, das expectativas dos candidatos à formação pré-graduada e da própria saúde dos doentes, isso deveria ser bem claro para todos aqueles que venham a interagir com os titulares de tais estudos.
De resto, não basta como faz o artigo 15º da Portaria em análise, prever que “as instituições de ensino superior devem garantir que a comunicação ou publicidade relativa aos ciclos de estudos conducentes ao grau de licenciado em Medicina Tradicional Chinesa não origina equívocos sobre a natureza do ensino ministrado e que não o tornam confundível com outros ciclos de estudos acreditados”.
O ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, e o ministro da Saúde ao assinarem esta Portaria estão a contribuir para um retrocesso sem precedentes na essência da fundamentação científica da investigação e na evolução da inovação tecnológica e terapêutica próprias da medicina. Uma atitude de consequências nefastas para a saúde das pessoas e dos doentes, que irá provocar um aumento imponderável na publicidade enganosa e na pseudociência. Atribuir validade científica por portaria e induzir as pessoas em erro criando licenciaturas em terapêuticas que não têm a devida fundamentação científica é legitimar de forma artificial cursos superiores que não servem os interesses dos doentes que o Estado tem a obrigação de proteger.
Esta decisão do ministro da Saúde e do ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, pode colocar em causa as relações institucionais entre a Ordem dos Médicos e o Governo e reforça de forma definitiva a desastrosa política de saúde que tem sido implementada nos últimos anos, com prejuízo grave para os doentes e para todos os profissionais de saúde que têm por formação e agem com base em conhecimentos fundados na evidência científica. A Ordem dos Médicos fica assim totalmente legitimada para liderar um processo de oposição firme de todos os médicos a uma política de saúde patológica que não serve os doentes nem o país.
A Ordem dos Médicos continuará a defender a saúde pública, a medicina e os doentes de práticas sem validade científica comprovada, do exercício ilegal da Medicina e da publicidade enganosa.
Conselho Nacional da Ordem dos Médicos
Bastonário da Ordem dos Médicos
Lisboa, 14 de Fevereiro de 2018