Sete em cada dez portugueses consideram insuficiente o investimento feito pelo Estado na saúde e quase 80% apontam a falta de médicos e de outros profissionais e os tempos de espera como os principais problemas do SNS. Estes dados constam de um estudo realizado pela GfK Metris para o movimento “Saúde em Dia”, constituído pela Ordem dos Médicos e pela Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares, com o apoio da Roche.
O estudo, intitulado “O que pensam, sentem e querem os portugueses para o futuro da Saúde”, foi apresentado no dia 3 de novembro e deixou claro que a maior parte dos inquiridos (90%) querem a criação de parcerias entre o Serviço Nacional de Saúde e o setor privado e social. Tendo em vista, sobretudo, o encaminhamento de doentes nos casos em que o SNS não consegue ter capacidade de resposta em tempo útil.
Outra das conclusões do estudo mostra que 56% dos participantes avaliam o SNS como “muito bom” e “bom”, 36% não o considera, “nem bom, nem mau”, enquanto 7% classificam-no como “mau” ou “muito mau”. Apesar desta avaliação tendencialmente positiva, os portugueses apontam como principais problemas a escassez de médicos e de outros profissionais de saúde no serviço público (37%) e os elevados tempos de espera para a marcação de atos médicos ou de saúde (42%).
O bastonário da Ordem dos Médicos sublinhou, na sessão de encerramento desta apresentação, a importância deste trabalho, uma vez que tem o mérito de ouvir verdadeiramente os portugueses “sobre o que querem para a saúde”. “As pessoas querem mais dinheiro para a saúde, querem ter um acesso mais fácil” e anseiam que o sistema como um todo possa dar “uma resposta mais adequada” às suas necessidades, afirmou. Miguel Guimarães destacou ainda que os inquiridos mostraram valorizar bastante ter médico de família pela “relação continuada e a proximidade”, embora apresentem “alguma queixa” relativamente aos tempos de espera para marcar consulta e a dificuldade em contactar o centro de saúde, o que também está relacionado com as opções políticas derivadas da pandemia. Ainda assim, 11% afirmou não ter médico de família, o que, extrapolando para a população nacional, vai ao encontro da realidade: mais de 1 milhão de portugueses não tem acesso a uma das principais portas de entrada no sistema de saúde.
Coube a António Gomes, diretor-geral da GfK Metris, apresentar e descodificar estes dados para a audiência que acompanhava a sessão presencialmente e também via streaming. Um dos dados mais fortes foi saber que um terço dos portugueses estaria disposto a contribuir com mais 5 euros por mês de impostos para contribuir diretamente para o SNS. 23% estariam mesmo disponíveis a pagar mais 10 euros mensais e 19% a dar um acréscimo de 20 euros mensais. “Isto significa que uma parte significativa dos portugueses quer que o SNS fique mais robusto e com mais capacidade de resposta, o que reflete a importância que os portugueses dão ao SNS e à sua própria saúde”, salientou mais tarde o bastonário da OM.
Também questionados sobre que medidas poderiam ser implementadas para melhorar o acesso ao SNS, o contributo dos inquiridos centrou-se em três questões fundamentais: contratação de mais médicos e profissionais de saúde, diminuição dos tempos de espera para consultas e um acesso facilitado a exames ou consultas de especialidade.
As pessoas estão preocupadas com a saúde e colocam-na em primeiro lugar: “Era bom que o Governo e os próprios partidos políticos tivessem esta perceção”, alertou Miguel Guimarães.
Este estudo foi feito através de mil entrevistas a adultos em Portugal, com uma amostra representativa da população. As entrevistas ocorreram entre 20 de setembro e 6 de outubro deste ano.
Depois da apresentação de António Gomes, houve espaço para um painel de comentário que contou com Teresa Anjinho (provedora-adjunta da Provedoria de Justiça), Isabel Saraiva (presidente da associação RESPIRA) e Daniel Sampaio (médico psiquiatra).
Teresa Anjinho, habituada a receber várias queixas de doentes, nomeadamente dirigidas à dificuldade de acesso, relembrou que “uma queixa é sempre um ato de confiança” e significa que, apesar do descontentamento, ainda existe uma crença no funcionamento das instituições. “Em algumas áreas, os tempos de espera chegam a 10 anos”, alertou, classificando a situação como inconcebível. “As pessoas querem mais recursos humanos, mais financiamento e, naturalmente, querem ter médico de família”.
“No final do dia nós queremos ser tratados”, resumiu Isabel Saraiva. “Muitos de nós [doentes] continuamos a experienciar dificuldades de acesso a consultas e diagnósticos”, alertou.
Doente severo por COVID-19 no ano passado, Daniel Sampaio teve uma visão diferente dos médicos que, até então, não conhecia na primeira pessoa. “A capacidade que os profissionais de saúde têm de ajudar os doentes” de forma incansável, exaltou. “Foi absolutamente extraordinária a dedicação e o profissionalismo dos profissionais de saúde”. O psiquiatra duvida que “num hospital privado existisse essa coesão de equipa” que testemunhou durante o tempo em que esteve internado. Elogiando o SNS, recordou que é preciso mudar e adaptar-se aos novos desafios. “Há que resolver os problemas de acesso”, disse, defendendo a convergência entre o setor público e o setor privado.
Consulte aqui a apresentação do estudo da GFK Metris.