Num encontro inédito em Portugal a Ordem dos Médicos e a Fundação Calouste Gulbenkian trouxeram a Portugal três peritos mundiais numa das áreas mais inovadoras em saúde: o conceito de valor e a metodologia dos cuidados baseados nesse mesmo valor (Value Based Healthcare) e a forma como esse conceito permite classificar as práticas de saúde como sendo de alto ou de baixo valor. Wendy Levinson (da Universidade de Toronto), Jeremy Grimshaw (da Universidade de Ottawa) e Pedro Delgado (do Institute for Healthcare Improvement e da Universidade de Harvard) juntaram-se no auditório 3 da Fundação Calouste Gulbenkian em Lisboa para discutir tópicos como equidade, formas de gestão modernas e a importância da de-implementação de práticas de baixo valor para proteção dos doentes contra efeitos negativos de práticas comprovadamente prejudiciais.
Nesta reunião científica apenas para convidados, a OM e a FCG promoveram um debate sob o mote “To do or Not to Do in Health Services”, que juntou médicos, decisores, sociedades científicas e associações de doentes para aprofundar o que poderá levar à necessária “mudança comportamental” que todos concordam que será necessária para assegurar o futuro. Tal como foi explicado por António Vaz Carneiro, que nesta reunião esteve numa múltipla função (como presidente do Conselho Nacional para a Formação Profissional Contínua da Ordem dos Médicos e coordenador do programa CWP – Choosing Wisely Portugal, mas também em representação do ISBE – Instituto de Saúde Baseada na Evidência e do bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães que não pôde estar presente no encontro por impossibilidade de agenda), o CWP é um programa de escolhas criteriosas em prol da saúde e centrado nos doentes, liderado por médicos mas desenvolvido com o contributo de todos, um trabalho de dimensão multiprofissional em que “a qualidade e a prevenção do dano” são o foco principal com vista a “reduzir o número de intervenções não necessárias e dar suporte à relação médico/doente” e a um diálogo que permita parar as práticas que comprovadamente se sabe que fazem mais mal do que bem. Mas, frisou, “nada disto é intuitivo” o que torna este trabalho mais complexo, até que se consiga sensibilizar para a mudança comportamental que também foi realçada precisamente pelos representantes dos doentes, nomeadamente por Paulo Gonçalves, presidente da RD-Portugal, como sendo essencial.Perante uma realidade incontornável, bem demonstrada por Jeremy Grimshaw que frisou que “20 a 25% dos cuidados médicos prestados são desnecessários e até podem ser prejudiciais” por provocarem efeitos adversos, o que podemos fazer? Wendy Levinson partilhou a experiência do Canadá, referindo as múltiplas ferramentas que podem ser usadas por todas as instituições de saúde e algumas campanhas em curso no seu país, como a campanha “Using blood wisely” onde se procura alargar o conhecimento junto dos profissionais de saúde de que as “práticas mais restritivas” são neste contexto muitas vezes seguras e eficazes, “e não só se protege o banco de sangue como se reduzem os riscos para o doente”, concretizou.
Depois de abordar os problemas de equidade e as formas de gestão mais eficazes e modernas em que palavras como respeito por todos e humildade são a base, Pedro Delgado foi perentório na resposta a quem questionou como avançar quando faltam dados, ou meios, ou vontade política… “Comecem onde estão. Usem o que têm. Façam o que podem”, instou num apelo à ação.
O encontro foi agraciado com a presença de António Feijó, presidente da FCG, e João Eurico da Fonseca, diretor da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, que realçaram a importância de um evento onde se fala de como melhorar os cuidados de saúde e do papel de todos para esse desígnio.