Na sequência de uma denúncia sobre uma instituição hospitalar que procurou exigir aos profissionais médicos a entrega dos diplomas em medicina, a Comissão Nacional de Proteção de Dados pronunciou-se no sentido de esclarecer que tal exigência é ilegal, excepto em casos muito específicos e apenas como parte do procedimento pré-contratual, visto ser a Ordem dos Médicos a entidade legalmente capacitada para atestar os requisitos para o exercício da profissão de médico, o que faz emitindo a cédula profissional. Pela sua relevância, reproduzimos em seguida este parecer da CNPD, datado de 30/10/2018:
“Em resposta à vossa correspondência com a refª …, relativa à exigência dos profissionais médicos entregarem diploma de licenciatura, considera a Comissão Nacional de Proteção de Dados que, independentemente de obrigações contratuais assumidas pelo …, a verificação da idoneidade técnica* dos recursos humanos relativos a profissões reguladas por ordens profissionais é efectuada pela apresentação da respetiva cédula profissional, nos termos previstos na legislação aplicável. Neste contexto, a exigência de certificado de licenciatura para este efeito é, pois, desnecessária e, consequentemente, excessiva – razão porque se considera estar a ser violada a alínea c) do nº 1 do art. 5º do Regulamento 2016/679 de 27 de abril de 2016 (Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados – RGPD).
A evocação de um contrato de gestão com o Estado não torna este dado necessário. Basta, aliás, ler atentamente a disposição citada por V. Exas. relativa ao Sistema de Gestão de Qualidade para se compreender que os pretensos requisitos «licenciamento/registo» têm natureza alternativa. Assim, existindo um registo público, nos termos da lei nacional, dos licenciados em medicina legitimados pela Ordem dos Médicos, nos termos legais, a exercer a profissão de médico, aquele é evidentemente suficiente. E a cédula profissional é, de acordo com o regime legal português, a credencial emitida pela Ordem profissional que, nos termos do mesmo regime, tem poderes para atestar os requisitos de elegibilidade para o exercício da profissão de médico. Deste modo, a pretender-se confirmar a veracidade do documento “credenciador”, deve essa confirmação ocorrer junto da Ordem dos Médicos.
Assinala-se, ainda, quanto à existência de consentimento do titular, que o consentimento dos trabalhadores é, nos termos da alínea 11) do art. 4º e dos considerandos 42 (parte final) e 43 do RGPD, juridicamente irrelevante para o efeito de legitimar a recolha ou consulta do dado pessoal daqueles.
Acrescenta-se ainda que apenas se em causa estiver um procedimento pré-contratual e houver lei ou regulamento administrativo a prever como requisito de admissão ou como fator de valoração uma determinada média final de licenciatura, pode ser legítimo fixar ex ante, como condição de admissão ao referido procedimento ou como fator relevante no âmbito do mesmo, a apresentação do certificado de licenciatura aos candidatos. Fora destas circunstâncias específicas, tal exigência é, reitera-se, violadora do princípio da proporcionalidade e do princípio da minimização dos dados pessoais – cf. alínea c) do nº 1 do art. 5º do RGPD.
Face ao exposto, caso pretendam manter o procedimento que descrevem, devem, no prazo de 10 dias, comunicar à CNPD a norma legal em que se baseiam para fundamentar o referido tratamento de dados pessoais.
* a este propósito refira-se que a CNPD desconhece o que seja idoneidade pessoal, quando não se indica qualquer norma legal que suporte e permita densificar a avaliação desta característica.”