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Nunca a felicidade foi tão preci(o)sa!

Autora: Tatiana Peralta, Médica Interna do 3º ano de Medicina Geral e Familiar, USF Serra da Lousã

 

Resumo

A pandemia SARS-CoV-2 sobrecarregou os profissionais de saúde e, por isso, é essencial abordar e prevenir o burnout com medidas concretas de forma a evitar consequências a médio e longo prazo. Uma organização de sucesso é aquela que tem a capacidade de aprender, de se reestruturar e crescer perante situações de crise. Que medidas preventivas instituir em cada uma das organizações?

 

O burnout define-se como um estado de exaustão física, emocional e mental e resulta do envolvimento profissional intenso com pessoas, conduzindo a um progressivo sentimento de inadequação e fracasso.1 A pandemia pelo SARS-CoV-2, tornou os profissionais de saúde ainda mais vulneráveis ao burnout.1,2 . No estudo “Impacto da covid-19: o papel da resiliência na depressão, na ansiedade e no burnout em profissionais de saúde”, da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, os dados preliminares, alertaram para  a existência de burnout em 52% dos profissionais de saúde. O stress no trabalho está relacionado com a doença e subsequentemente com menor produtividade, aumento do absentismo, acidentes de trabalho, erros de desempenho, invalidez, morte prematura e problemas familiares.1

As pessoas são parte primordial das organizações. Na USF Serra da Lousã é defendido que o bem-estar dos trabalhadores é uma força motriz para os interesses da organização, mas por outro lado, tenta-se conciliar o desempenho organizacional e a realização pessoal dos profissionais. Nesse sentido, a USF criou em 2011 o Núcleo da Felicidade, constituído por diversos profissionais da unidade – médico interno, médicos especialistas, assistentes operacionais, enfermeiros e secretário clínico – com a missão de promover um maior contacto entre pares, estreitar laços de confiança e amizade com impacto no desempenho individual e colectivo.

A USF Serra da Lousã é constituída por 28 profissionais – seis médicos especialistas, seis enfermeiros, quatro secretários clínicos, oito internos da formação especifica de Medicina Geral e Familiar e três assistentes operacionais. É uma equipa madura que se tem mostrado eficiente e capaz de lidar com a adversidade ainda que em estudos anteriores relacionados com burnout (último realizado em fevereiro/2020 – inventário de burnout de Maslach-MBI-HSS), 7,1% dos profissionais apresentavam burnout, ou seja, uma combinação de altos níveis de exaustão emocional e despersonalização e baixo nível de realização pessoal. Ainda não há dados no contexto da epidemia, mas estima-se, à semelhança do panorama nacional e internacional, que sintomas como a exaustão e ansiedade sejam agora mais prevalentes.

No Agrupamento de Centros de Saúde do Pinhal Interior Norte, o Conselho Técnico da Unidade de Recursos Assistenciais Partilhados elaborou uma série de sugestões de autocuidados nas áreas da Fisioterapia, Nutrição e Psicologia com envio via-email de panfletos com recomendações.

No entanto, entende-se que, perante esta situação de crise, é exigida uma intervenção cirúrgica (dirigida e eficaz) de prevenção do burnout que poderá passar pela disseminação destes Núcleos (“da Felicidade”) cujo objetivo seja identificar localmente necessidades e implementar medidas.

Uma liderança eficaz, formação adequada e comum, comunicação ativa, feedback positivo, a partilha, o companheirismo e o espírito aberto são fatores que contribuem para a diminuição da incidência de burnout.1 Mas de que forma se podem ativar estes fatores?

 

Algumas das medidas que o Núcleo da Felicidade tem tentado implementar têm a ver com:3

– Momentos de pausa no horário: pausa do café, passeio à hora de almoço;

– Atividades de desatenção/alteração do foco: desafios, enigmas, quebra-cabeças;

– Criação de linhas de diálogo entre colegas e partilha de experiências positivas – “as minhas memórias” – partilha de casos positivos, viagens, momentos marcantes da organização em espaço partilhado, “going home checklist”;

– Partilha de preocupações – criação de diário de bordo da organização;

– Criação de canais de comunicação: fórum da USF (e-mail), mensagens (recurso ao sistema informático);

– Estar atento: saber identificar colegas que necessitem de apoio (p.e. profissionais que estão em distanciamento para evitar contágio dentro do agregado familiar).

 

Tem sido um desafio permanente criar e adaptar as tarefas/momentos de lazer e desatenção, sem comprometer as normas de segurança dos profissionais, nem condicionar sentimento de sobrecarga.

Sem dúvida que o papel de cada um dos profissionais é essencial em promover o seu bem-estar. Importa ainda, nesta fase, que cada uma das organizações invista no amadurecimento individual e no próprio equilíbrio pessoal. Esta é uma oportunidade para nos conhecermos melhor enquanto pessoa, profissional e organização pelo que urge o planeamento de medidas efetivas na prevenção do burnout a médio e longo prazo que poderá passar pela criação de Núcleos/Equipas dedicadas para o efeito.

 

Referências bibliográficas:

1- World Health Organization (WHO). Mental Health and Psychosocial Considerations during the COVID-19 Outbreak. Disponível online: https://www.who.int/docs/default-source/coronaviruse/mental-health-considerations.pdf (acedido a 9 Junho 2020).

2- Kluge, H.H.P. WHO Regional Director for Europe—Statement to the Press: Physical and Mental Health Key to Resilience during COVID-19 Pandemic; WHO: Copenhagen, Denmark, 2020.

3- Blake H, Bermingham F. Psychological wellbeing for healthcare workers: mitigating the impact of covid-19. The University of Nottingham. Version 1.0, April 2020. Disponível online https://www.nottingham.ac.uk/toolkits/play_22794. (acedido a 9 Junho 2020).