O bastonário da Ordem dos Médicos foi um dos convidados da Associação para o Desenvolvimento Económico e Social (SEDES) para participar no V Congresso da SEDES, que teve um painel exclusivamente dedicado aos Recursos Humanos e Sustentabilidade na Saúde. Na sua intervenção, Miguel Guimarães defendeu ser urgente uma transformação do Serviço Nacional de Saúde, para que se possa adaptar às necessidades atuais, mas também ao mercado privado e europeu. No entendimento do bastonário, é crítico “aplicar na prática a carreira médica, um mecanismo dentro do próprio SNS que foi e é estruturante”.
Miguel Guimarães traçou um cenário das dificuldades atuais – com os concursos para novos especialistas a ficarem com muitas vagas por ocupar, já que as pessoas procuram outros projetos –, para depois defender que é preciso começar por valorizar o capital humano de várias formas. “Não podemos deixar de respeitar as pessoas que salvam vidas todos os dias”, insistiu, reforçando que “temos de envolver os profissionais nas decisões”. “É de extrema importância motivar as pessoas e criar um espírito positivo no trabalho que se está a fazer”, acrescentou.
O bastonário elogiou, ainda, o percurso do SNS, entendendo que, contudo, chegou a hora de mudar. “Não podemos continuar a ter um sistema público a funcionar da mesma forma há 42 anos. Funcionou muitíssimo bem e respondeu aos desafios que na altura se colocavam aos portugueses, mas já não consegue dar exatamente a mesma resposta”, disse.
O painel foi moderado pelo presidente da SEDES, Álvaro Beleza, e pelo antigo ministro da Saúde Adalberto Campos Fernandes. A bastonária da Ordem dos Farmacêuticos foi outra das oradoras deste painel, afirmando que “já não somos o país que éramos antes da pandemia. Somos outro país, outra Europa, outro mundo”. Assim, Ana Paula Martins entende que a “capacidade de resistir em conjunto é muito importante nesta fase”, e que o caminho passa por fazer uma “avaliação séria, independente e não politizada” do que é preciso evoluir em termos de capital humano e de carreiras. Da investigação à transição digital, várias foram as soluções avançadas, mas com a bastonária também a defender que a empatia das lideranças é crítica.
Por seu lado, o diretor da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa corroborou que Portugal é dos países que mais médicos forma, pelo que o problema que temos não é de quantidade. Para Fausto Pinto há sim uma incapacidade de fixar profissionais, que já foi ultrapassada por outros países da Europa. “A liderança em saúde tem de ter uma visão médica. Devemos ser das áreas com mais pessoas não ligadas à área médica nos mecanismos de decisão”, alertou, reiterando que este é um dos problemas que urge ultrapassar.
O presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares concordou que há um problema nas lideranças. Mas para Alexandre Lourenço o essencial era dar mais autonomia às administrações. “Temos uma gestão muito limitada para responder às necessidades individuais e para oferecer um projeto”, admitiu, apontando a instabilidade na gestão política como outra dificuldade.
A última intervenção coube à enfermeira Teresa Oliveira, enquanto elemento do Health Parliament, que partilhou a sua experiência pessoal, já que trabalhou 10 anos no Reino Unido em busca de melhores condições. Voltou para Portugal porque quer construir um sistema de saúde melhor e, para isso, também entende que os recursos humanos têm de ser vistos como “pensadores” e não com meros “executantes”.
No encerramento da sessão, e protagonizando uma leitura global do painel, Adalberto Campos Fernandes instou o poder político “no quadro de uma democracia adulta”, a ouvir os representantes das várias profissões e responsabilizar também os mesmos. Para o antigo ministro, o Governo não pode hostilizar quem constrói o SNS. “Uma reforma estrutural das profissões de saúde obriga a um grande envolvimento do conjunto do Governo”, asseverou, explicando que é essencial que as Finanças entendam a “utilidade estratégica dessa revisão”. Ainda assim, Campos Fernandes acredita que nem tudo é dinheiro e admite que “nunca vamos conseguir pagar no público o que no privado pagam”.