A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que metade da população mundial não tem acesso a serviços essenciais de saúde e que quase 100 milhões de pessoas são obrigadas a sobreviver com menos de dois dólares por dia, tendo que pagar os serviços de saúde do seu próprio bolso. Ainda segundo a OMS mais de 800 milhões de pessoas (quase 12% da população mundial) gastam pelo menos 10% do orçamento familiar em despesas de saúde para si próprio, para uma criança doente ou outro membro da família.
São dados preocupantes e que neste Dia Mundial da Saúde nos devem obrigar a pensar na responsabilidade social e económica que os países desenvolvidos da Europa e do Continente Americano têm, ou deveriam ter, para com os países subdesenvolvidos.
Mas que não devem deixar de nos fazer olhar para a realidade que, antes de mais, temos dentro da nossa própria “casa”. Em Portugal, em 2017, segundo um estudo desenvolvido pela NOVA-IMS, foram contabilizadas quase 800 mil faltas a consultas por causa dos gastos com transportes e 750 mil faltas a consultas devido aos custos com as taxas moderadoras. O mesmo trabalho estima que 10,8% dos portugueses optaram por não fazer a terapêutica prescrita pelo médico devido a insuficiência económica, tal como já tinha sido relatado antes pela OCDE.
A saúde é um bem essencial e devia ser acessível para todos em condições de equidade. Isso não está a acontecer! Os dados publicados pela Nova-IMS, bem como por outras organizações internacionais, são preocupantes. Até porque sabemos que em Portugal, segundo dados do Instituto Nacional de Estatística referentes a 2016, mais de 33% das despesas em Saúde foram suportadas diretamente pelas pessoas e, em particular, pelo orçamento das famílias, que representou quase 28% das despesas correntes em Saúde.
Por mais que se prove que há retorno (e, por isso, poupança) do investimento e que o país fica a ganhar com maior dotação orçamental para Saúde, o Governo insiste em empatar a contratação de profissionais de saúde e a aquisição ou renovação de equipamentos, mantendo o Serviço Nacional de Saúde subfinanciado.
Há muito que a Ordem defende a importância de reforçar a dotação orçamental para a área da Saúde. Até porque a despesa em Saúde não deve ser encarada como um desperdício, mas antes como um investimento a médio e longo prazo, reforçando a promoção da saúde, a prevenção da doença e melhor acesso e qualidade nos cuidados de saúde. Um investimento que permitirá reduzir o absentismo, aumentar a produtividade individual e colectiva, e reduzir os custos com o tratamento de doenças crónicas evitáveis ou controláveis.
O atual Orçamento de Estado para a Saúde é claramente insuficiente face às reais necessidades dos cidadãos. O Ministério da Saúde continua a ter um longo caminho pela frente nos compromissos que assumiu publicamente perante os portugueses.
É essencial renovar a maioria dos equipamentos das unidades de saúde do SNS, é urgente equilibrar e reforçar o capital humano no SNS, aumentar a capacidade de resposta às necessidades dos doentes e melhorar as condições de trabalho dos profissionais de saúde.
Ainda existem cerca de 700 mil portugueses sem médico de família. Milhares de utentes aguardam meses, por vezes anos, por uma consulta de especialidade hospitalar ou por uma cirurgia, ultrapassando claramente os tempos máximos de resposta garantidos. Porque faltam milhares de profissionais de saúde e, em especial, médicos. E também porque não existem os equipamentos adequados às necessidades dos cidadãos. Isto não é admissível!
Todos os compromissos assumidos pelo ministro da Saúde não são possíveis de concretizar sem um reforço significativo do financiamento do serviço público. Como irá alcançar os principais objetivos, nomeadamente assegurando o acesso a cuidados de Saúde a todos os seus concidadãos, quando a dotação orçamental para 2018 se ficou pelos 5,2% do PIB?
É urgente apostar numa política de Saúde feita com pessoas e para as pessoas. Para que tenhamos, como a OMS invoca, uma Saúde para todos!
Miguel Guimarães
Bastonário da Ordem dos Médicos
Saúde para todos: Um bem que urge promover (Artigo de Opinião do Sr. Bastonário)