O Parlamento debateu e aprovou, no dia 9 de junho, a despenalização da morte medicamente assistida, após dois vetos presidenciais. Em discussão e votação estavam iniciativas de PS, Bloco de Esquerda, PAN e IL que deixam cair a exigência de “doença fatal”.
Em declarações à comunicação social, o bastonário da Ordem dos Médicos defendeu que este “não é o momento” para discutir esta matéria. Miguel Guimarães lamenta que “numa altura de tantas dificuldades no acesso a cuidados de saúde” em que, por exemplo, vários doentes oncológicos estão a ser operados fora daquilo que são os tempos máximos de resposta garantidos, as prioridades dos políticos estejam trocadas. “O foco de quem tem responsabilidades políticas em Portugal deve estar no Serviço Nacional de Saúde e também naquilo que são os cuidados paliativos que são muito importantes, quer para os doentes, quer para as suas famílias”.
Os números mostram que existem deficiências graves do sistema de saúde na defesa de cuidados de qualidade no fim de vida. Apenas 20% dos doentes elegíveis para cuidados paliativos têm de facto acesso aos mesmos. “Essa devia ser a prioridade”, juntamente com o reforço do investimento em melhores e mais alargados cuidados de saúde que cheguem efetivamente a toda a população. “Não há nenhum hospital português que não tenha neste momento dificuldades sérias” e os esforços para as resolver ficam aquém do esperado. “É previsível que muitos doentes acabem por morrer prematuramente por falta de acesso. É isto que tem de ser discutido”.
O bastonário olha ainda com apreensão para a “evolução” dos moldes em que a morte medicamente assistida está a ser colocada em cima da mesa. “Começou-se por falar de situações muito raras, mas neste momento os projetos de lei que temos em cima da mesa são muito abrangentes”, “temos de ter muita atenção a esta matéria”, alertou.
No caso do projecto de lei do Bloco, que é praticamente igual ao do PS e do PAN, a Ordem dos Médicos emitiu um parecer onde assinala que se “subestimam os progressos médicos na atenuação do sofrimento”, se diminui o papel da solidariedade e dos cuidados paliativos e se ficciona uma “absolutização da vontade individual”. Vinca também que “matar o doente a seu pedido, por administração de uma injecção ou facultando um fármaco com a intenção de matar, são práticas que não se enquadram no exercício da medicina. (…) A eutanásia e o suicídio assistido podem ser despenalizados ou autorizados por lei, mas não pertencem à medicina, não se configuram como actos médicos.” A Ordem diz mesmo que implicar um médico na “execução da morte (…) não deixa de ser uma violação de cânones éticos e deontológicos que regem a profissão”.