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Diabetes e a doença macrovascular: Como minimizar o risco?

Autoras: Mariana Bensaúde e Inês de Lima Ferreira, Médicas Internas de MGF no 4º e 2º ano respetivamente (USF Luísa Todi – ACES Arrábida – Setúbal)

Resumo: A Diabetes mellitus é uma doença crónica de grande prevalência na nossa sociedade e cada vez mais frequente nas nossas consultas. A descompensação dos níveis de glicose origina complicações micro e macrocasculares. Os diabéticos são rastreados anualmente para complicações como a retinopatia, nefropatia e a doença vascular periférica, mas muito pouco é feito para diagnosticar a doença cardiovascular. A educação para a saúde através do médico de família é crucial. Se houver uma vigilância periódica e um controlo rigoroso da glicémia, tensão arterial e do colesterol, há um risco reduzido de complicações macrovasculares.

 

A Diabetes mellitus (DM) é uma doença crónica de grande prevalência na nossa sociedade e cada vez mais frequente nas nossas consultas. É um sério problema de saúde pública, com elevadas taxas de morbilidade e mortalidade, que afeta atualmente mais de um milhão de portugueses.

Com o passar dos anos, a descompensação dos níveis de glicose resulta em lesões nos vasos sanguíneos, com complicações crónicas em diversos orgãos. As complicações microvasculares, das quais são exemplos a retinopatia, a nefropatia e a neuropatia, constituem as principais causas de cegueira, insuficiência renal e amputação dos membros inferiores.

As complicações macrovasculares, que incluem a doença arterial coronária, doença cerebrovascular e a doença arterial periférica são as principais responsáveis pela morbilidade e mortalidade nos diabéticos. O número de internamentos por AVC e EAM são uma tendência crescente nos últimos anos e segundo dados publicados pela Direcção Geral de Saúde, 30% dos internamentos por AVC e 32% dos internamentos por EAM ocorrem em diabéticos. Estes dados reforçam a necessidade de intensificar a prevenção da doença macrovascular aterosclerótica.

Nos Cuidados de Saúde Primários (CSP), a vigilância do doente diabético envolve o doseamento da microalbuminúria para controlar a doença renal, a avaliação oftalmológica para prevenção da retinopatia diabética e a avaliação do risco de pé diabético de modo a prevenir lesões precurssoras de complicações.  E o que devemos fazer para rastrear a doença macrovascular?

O prognóstico do doente diabético é fortemente condicionado pela presença de doença macrovascular, em grande parte pela doença coronária. Deste modo, torna-se imperativo a deteção precoce de doença cardíaca juntamente com a necessidade de rastreio. No entanto, a posição da Associação Americana de Diabetes (AAD), não recomenda o rastreio a doentes assintomáticos com diabetes, por não considerar custo-efetivo. A evidência de que o rastreio pode reduzir os eventos cardiovasculares é insuficiente. Atualmente, as diretrizes da AAD recomendam apenas o ECG de rotina em diabéticos assintomáticos. Deve-se considerar a Prova de Esforço e o Ecocardiograma TT apenas se o ECG for anormal, na presença de sintomas cardíacos ou na presença de sinais de doença vascular associada tais como sopros carotideos, AIT, AVC, claudicação ou doença arterial periférica.

Enquanto a investigação do doente diabético com angina de peito é intuitiva, o uso de exames cardíacos de diagnóstico nos doentes assintomáticos com diabetes é discutível dentro da comunidade médica. Posto isto, o verdadeiro desafio é decidir o melhor teste cardíaco não invasivo em doentes assintomáticos com DM.

É sabido que a angiografia coronária é altamente sensível e muito específica para o diagnóstico de doença arterial coronária. Contudo, por ser um exame caro e invasivo não é um bom método de rastreio. Em alternativa, a Prova de Esforço é um exame seguro, relativamente barato e com sensibilidade e especificidade aceitável.  Os diabéticos são rastreados anualmente para complicações como a retinopatia, nefropatia e a doença vascular periférica, mas muito pouco é feito para a doença cardiovascular (DCV), uma complicação possívelmente terminal. Todos os diabéticos, principalmente aqueles com fatores de risco para doenças cardíacas, devem ser acompanhados de perto para o desenvolvimento de sintomas de DCV e muitos necessitam de testes de diagnóstico. Segundo a AAD, o fundamental para minimizar as complicações é o controlo, tratamento e modificação dos fatores de risco. Por exemplo, o tabagismo duplica o risco a 10 anos de ter um evento cardiovascular e a obesidade aumenta a probabilidade de DCV em 30 a 40%.  A educação para a saúde é, sem dúvida, a melhor arma do médico de família. Se houver uma vigilância periódica e um controlo rigoroso da glicémia, tensão arterial e do colesterol, há um risco reduzido de complicações macrovasculares. Nós, médicos de familia, temos um papel crucial na promoção de estilos de vida saudáveis, ao reduzir a prevalência de obesidade, tabagismo e consumo excessivo de álcool.

Na consulta de Diabetes e na avaliação da doença macrovascular propriamente dita existem outros fatores a ter em conta. Começando pela anamnese, esta deve procurar a presença de DCV prévia ou história familiar de eventos cardiovasculares precoces. Deve-se também questionar diretamente a presença de sintomas de dor torácica típica ou atípica, a presença de dispneia com o esforço, claudicação intermitente e de dor dos membros inferiores em repouso (excluindo a dor neuropática). O exame físico deve incluir a auscultação cardíaca, pesquisa de sopros arteriais (carotídeos, abdominais e femorais), palpação de pulsos periféricos e um exame rigoroso dos membros inferiores.

Os doentes com DM, mesmo sem doença aterosclerótica estabelecida, apresentam um risco mais elevado de desenvolver eventos vasculares no futuro. Uma vez que o risco absoluto para DCV varia entre os doentes, podemos utilizar o score de Framingham para determinar o risco a 10 anos de um evento cardiovascular. Este inclui fatores de risco tradicionais: idade, sexo, tabaco, tensão arterial, colesterol total e HDL. Posto isto, o risco cardiovascular pode ser substancialmente reduzido se os níveis de colesterol e tensão arterial estiverem controlados.

Em conclusão, a Diabetes constitui hoje-em-dia uma das principais causas de morte, principalmente por implicar um risco signicativamente aumentado de doença coronária e de acidente vascular cerebral. É de particular relevância estar vigilante para identificar os diabéticos em risco, estando demonstrado que as intervenções farmacológicas e de aconselhamento realizadas ao nível dos CSP são as mais eficazes e custo-efetivas na gestão dos fatores de risco para DCV.

 

Referências Bibliográficas:

  1. American Diabetes Association’s (ADA’s) Standards of Medical Care in Diabetes – 2018 http://care.diabetesjournals.org/content/41/Supplement_1
  2. Programa Nacional Para a Diabetes – 2017 www.dgs.pt
  3. Relatório Anual do Observatório Nacional da Diabetes– Edição de 2016 http://spd.pt/images/OND/DFN2015.pdf
  4. Cardiovascular Risk Assessment in Patients with Diabetes, Diabetology & Metabolic Syndrome 20179:25, https://doi.org/10.1186/s13098-017-0225-1
  5. Screening for Coronary Artery Disease in Patients with Diabetes, Diabetes Care 2007 Oct; 30(10): 2729-2736, https://doi.org/10.2337/dc07-9927