Neste dia 27 de março, assinala-se o Dia Nacional do Dador de Sangue e, dois anos após o início da pandemia de Covid-19, Maria Antónia Escoval, diretora do Instituto Português do Sangue e da Transplantação (IPST), revela que durante a situação pandémica a maior dificuldade foi ter oportunidade de chegar às pessoas. “A maior parte das nossas sessões de colheita realizavam-se nos locais de trabalho e nos estabelecimentos de ensino superior. Com a pandemia as pessoas começaram a trabalhar a partir de casa e os alunos passaram, também, a ter aulas não presenciais, isso constituiu para nós, nos últimos 2 anos, um importante desafio. Nós utilizávamos muito as unidades móveis que estavam em locais-chave na via pública, e ficamos impedidos de os usar por questões de distanciamento social.”
Em relação à diminuição das dádivas de sangue durante os dois primeiros anos de pandemia, Maria Escoval garante que mesmo durante esse período foi possível responder sempre às necessidades dos hospitais uma vez que a diminuição das dádivas correspondeu a uma igual diminuição na atividade assistencial. Em 2020 houve “uma diminuição de 7% na dádiva de sangue em Portugal, mas isso correspondeu ao que aconteceu também na Europa, nos Estados Unidos da América e no Canadá, ou seja, corresponde a uma diminuição global.” Contudo, de acordo com os dados do IPST, em 2021 a situação não só melhorou, como também se reverteu uma vez que “as dádivas aumentaram 7,8% em relação a 2020 e 1,7% em relação a 2019”.
As fases mais conturbadas da pandemia de Covid-19, ou seja, as vagas de janeiro de 2021 e de 2022, deram origem a dois grandes apelos, contudo a diretora do IPST relembra que “é um cenário que se vem a repetir todos os anos porque no mês de janeiro há um aumento das infeções respiratórias e, portanto, mesmo antes da pandemia nós tínhamos uma diminuição no número de dadores, trata-se apenas da nossa sazonalidade”. O apelo de janeiro de 2021 deu origem a uma enorme onda de solidariedade por parte dos portugueses mesmo estando ainda em confinamento devido às regras governamentais. “Foi o apelo que teve a resposta mais visível, chegamos a ter filas de espera de 5 horas. Os nossos centros de colheita que, normalmente, fecham às 20h, chegaram a estar abertos até à 1 da manhã”. Já em janeiro de 2022, com o enorme número de infeções, as pessoas estavam casa porque estavam infetadas ou porque estavam em isolamento profilático, o que teve impacto nas dádivas. “No entanto conseguimos nunca parar. Estes dois janeiros foram alturas críticas, mas felizmente conseguimos dar sempre resposta e 2021, de acordo com os dados do IPST, foi um ano superior a 2019”.
Questionada acerca dos principais desafios que dádiva de sangue enfrenta em Portugal, num cenário sem pandemia, Maria Antónia Escoval aponta para o envelhecimento da população portuguesa e para a dificuldade em chegar à população no auge da carreira profissional. “A dádiva de sangue faz-se preferencialmente, entre os 18 e os 65 anos, portanto é um enorme desafio para nós manter efetivamente a dádiva de sangue em Portugal tendo em conta estes fatores”. A dádiva de sangue em Portugal intensifica-se em dois grandes grupos populacionais, os jovens dos 18 ao 24 e os adultos dos 45 aos 65 anos. “O nosso enorme problema é a população dos 25 aos 44 anos. Este grupo populacional, em idade ativa, é mais difícil chegar porque é uma população que tem grandes aspirações profissionais e familiares e está muito mais ocupada.”
Cristina Ferreira, responsável pela promoção da dádiva no IPST, atribui, também alguma responsabilidade às entidades patronais. “É muito difícil as pessoas ausentarem-se do local de trabalho para virem doar sangue, nem todas as empresas têm essa flexibilidade e estão sensíveis a isso. Na maioria das vezes o que as pessoas fazem é vir depois de um dia de trabalho ou ao sábado, ou seja, no seu tempo de descanso. Por isso mesmo nós, o ISPT, temos calendarizadas uma série de sessões de colheita e tentamos sempre ir ao encontro da disponibilidade das pessoas.” Cristiana Fagulha, responsável do Planeamento e Programação de Colheitas e Promoção do Posto Fixo do IPST, relembra que “todos os dias nos hospitais portugueses há pessoas que precisam de sangue e são necessárias cerca 800 a 1000 unidades de sangue diariamente. A única maneira de termos sangue é através da dádiva de alguém e esse é um gesto que pode fazer a diferença entre a vida e a morte de um doente”. Cristina Ferreira apela, por fim, a que todos os portugueses elegíveis para doar sangue o façam “durante todo o ano, porque se todos fizerem a sua dádiva, regularmente, e não só em alturas pontuais, por exemplo, quando há apelos, conseguimos ter sempre os nossos stocks equilibrados e seguros”.