A Ordem dos Médicos foi ao final do dia de ontem surpreendida com notícias publicadas em vários órgãos de comunicação social, com base nas conclusões de um inquérito conduzido pela Inspeção Geral das Atividades em Saúde e que visava apurar factos relativos à intervenção das entidades do Ministério da Saúde no surto ocorrido no Lar da Fundação Maria Inácia Vogado Perdigão Silva (FMIVPS), em Reguengos de Monsaraz. A este propósito cumpre-nos transmitir alguns factos:
– Nem o Ministério da Saúde nem a IGAS notificaram a Ordem dos Médicos sobre as conclusões do inquérito referido;
– Assim, foi através de uma nota enviada à comunicação social pelo Gabinete da Ministra da Saúde, que a OM tomou conhecimento de um relatório que, de forma inexata e imprecisa, lhe aponta baterias através da divulgação de informação inserida em contexto não devidamente circunstanciado, ficando claro que o Ministério da Saúde prefere antes de notificar o Relatório à Ordem, que é um claro destinatário das conclusões da IGAS, gerar por uma nota à comunicação social o ruído político que permita criar um ambiente de confrontação;
– Na verdade, a Ordem dos Médicos nunca foi ouvida pela IGAS no âmbito do inquérito em causa, o que, à luz do princípio do contraditório, entre outros, impunha a esta entidade a adoção de um procedimento distinto;
– Apesar do inquérito visar, em princípio, os factos relativos à intervenção das entidades do Ministério da Saúde, a OM verifica que o Gabinete da Ministra da Saúde preferiu centrar as suas afirmações e acusações em estruturas externas, nomeadamente na Ordem dos Médicos, o que denota, uma vez mais, que nada mudou deste a altura do surto, quando o Ministério da Saúde e todas as instituições por ele tuteladas se preocuparam mais em questionar a competência da Ordem dos Médicos para a auditoria clínica do que em identificar e corrigir as falhas na resposta ao surto e, dessa forma, evitar a repetição do problema noutros lares; Recorde-se que ficou comprovada na auditoria a falta de recursos humanos para administrar os cuidados necessários, falta de condições para delimitar a transmissão do vírus, falta de rastreio atempado, falta de intervenção decisiva da Autoridade de Saúde Pública, falta de coordenação e gestão das autoridades competentes por forma a proteger doentes e profissionais de saúde e atraso na transferência de infetados para um “alojamento sanitário” onde faltava liderança clínica e onde os cuidados potencialmente exigíveis pela condição dos doentes eram desadequados;
– A Ordem dos Médicos recorda que enviou as conclusões da sua auditoria para várias entidades, muito em particular para o Ministério Público e reitera a confiança nas instituições competentes e independentes para apurar as responsabilidades de um surto que vitimou 18 pessoas; A Ordem e os membros dos seus órgãos têm consciência que a sua atuação não só foi útil no caso concreto, porque obrigou a uma correção significativa de procedimentos em Reguengos de Monsaraz, como teve repercussões positivas, a partir dessa data, em todo o país;
– A Ordem dos Médicos reitera que nenhum médico de família se escusou a prestar apoio aos utentes do Lar de Reguengos de Monsaraz, pese embora a escolha impossível de ter de optar entre esses doentes e todos os outros doentes que tinham inscritos nas suas listas e que serão sempre prejudicados pelas suas ausências para cumprir turnos de trabalho, muito diferentes do que configura uma situação de apoio domiciliário pontual;
– A Ordem dos Médicos, que no âmbito das suas atribuições pretende contribuir para a defesa da saúde dos cidadãos e dos direitos dos doentes, continuará a resistir a todas as manobras inqualificáveis e aos ataques políticos que visem desviar as atenções do que realmente aconteceu em Reguengos de Monsaraz, i.e., uma violação grave de direitos humanos constitucionalmente consagrados, como, aliás, concluiu a Comissão dos Direitos Humanos da Ordem dos Advogados no seu relatório de 15 de outubro de 2020.
– A forma como está a ser gerido o inquérito da IGAS reforça a censura formal da OM pelo modo como o Ministério da Saúde sempre lidou com o Caso do Lar de Reguengos de Monsaraz preferindo o branqueamento da atuação da Administração Regional de Saúde do Alentejo, da Autoridade de Saúde Regional e Local, das entidades municipais à assunção de responsabilidades pela inexistência de condições no Lar e pelo incumprimento das orientações básicas da DGS aplicáveis ao caso concreto.
– Pelo que, a Ordem dos Médicos não permitirá que se ataque o mensageiro, ao invés de se apurar a realidade e de tomar as medidas que se impunham, e está e estará atenta aos interesses da sociedade civil, exigindo das estruturas estatais a devida atenção à realidade dos lares, que reclamam melhores condições de vida para os nossos idosos.
Lisboa, 10 de março de 2021