O Conselho Nacional do Médico Interno (CNMI) vem por este meio reagir às declarações da Sra Ministra da Saúde ao semanário Expresso, segundo as quais será “equacionada a celebração de pactos de permanência no SNS” após a conclusão da formação especializada (especialidade) dos médicos.
Terminado o curso de Medicina, os jovens médicos iniciam o seu internato por 1 ano de Formação Geral, seguindo-se 4-6 anos de formação na sua Especialidade, período durante o qual têm um contrato de trabalho de 40 horas/semana, cumprindo um papel essencial nos respetivos serviços. Além de assegurarem funções no internamento, consulta, bloco operatório e urgência, os médicos internos (cerca de 1⁄3 dos médicos do SNS) têm ainda que cumprir os objetivos de formação previstos para a sua especialidade, e que passam pela conciliação da frequência de cursos obrigatórios suportados pelo próprio médico, da elaboração de trabalhos de investigação e do estudo intensivo nas respetivas áreas de conhecimento, com uma exigente vida clínica e longas horas extraordinárias no hospital (muitas vezes não remuneradas, totalizando não raramente 60 horas semanais de trabalho).
Os médicos internos são, deste modo, cruciais ao funcionamento do SNS, com especial enfoque nos Serviços de Urgência, onde trabalham em condições frequentemente desumanas, lado a lado com os seus Orientadores de Formação, que se dedicam, num exercício de altruísmo, a transmitir o seu conhecimento aos colegas mais novos sem qualquer tipo de remuneração adicional. É então evidente que não existe um real “investimento” do Estado na formação dos médicos internos, mas apenas o mero pagamento de trabalho efetivamente prestado por estes no SNS, trabalho esse que é fundamental para continuar a garantir o acesso da população a serviços de saúde de qualidade.
Infelizmente, no final do internato, muitos recém-especialistas estão desgastados pela enorme carga de trabalho assistencial, sem perspetivas de construção de carreira, descrentes pela degradação inexorável do SNS nos últimos anos e impedidos de exercer uma Medicina de qualidade e que dignifique a sua profissão e os cidadãos em prol dos quais trabalham. Consequentemente, optam por não permanecer no SNS e enveredar por percursos alternativos mais apelativos e com condições de trabalho de acordo com a sua diferenciação.
É com preocupação que assistimos ao êxodo de excelentes profissionais do serviço público. Deve ser uma prioridade do Ministério da Saúde encontrar soluções para cativar estes jovens especialistas a permanecer no SNS e garantir a sua sustentabilidade futura. Não é pela imposição autocrática da vinculação obrigatória que se conseguirá motivar os profissionais a permanecer, mas sim através da garantia de condições de trabalho que os façam vestir a bata pelo SNS.
O CNMI manifesta as suas reservas em relação aos pactos de permanência anunciados, solicitando uma clarificação cabal e detalhada das reais intenções do Ministério da Saúde quanto às medidas para fixação de médicos no SNS e respetivas condições de implementação.
O Bastonário da Ordem dos Médicos | MIGUEL GUIMARÃES
A Presidente do Conselho Nacional do Médico Interno | CATARINA PERRY DA CÂMARA
16 de novembro de 2019