O diretor executivo do Serviço Nacional de Saúde (SNS) entrou na passada quarta-feira em funções. Teoricamente, a missão do organismo passa, entre outras funções, por coordenar a resposta assistencial das unidades de saúde do SNS, assegurando, por exemplo, o seu funcionamento em rede.
Em entrevista ao jornal Público, o bastonário da Ordem dos Médicos fez a antevisão de quais os indicadores do SNS que precisam de um maior destaque por parte do seu diretor executivo e quais as reformas que considera mais urgentes.
Em relação aos números de médicos existentes no SNS, o bastonário considera que a fixação de profissionais está diretamente relacionada com a criação de condições dignas e atrativas. Para Miguel Guimarães este é “o desafio maior” tanto para a retenção dos recém-formados, como dos médicos especialistas. “Este aspeto, obviamente, engloba uma revisão da carreira médica, que é essencial”, alertou.
As condições necessárias para valorizar os médicos e fixá-los no SNS passam pelo “acesso à inovação terapêutica e tecnológica”, pela definição de tempo protegido para “a investigação”, pela “flexibilidade dos horários de trabalho”, entre outras. Mas é em “premiar a qualidade daquilo que é feito” que o representante dos médicos acredita estar a chave para a verdadeira valorização: “É preciso introduzir indicadores de qualidade que são essenciais para que os médicos sintam que são bem tratados, respeitados e que o seu trabalho é valorizado.”
O número, cada vez maior, de utentes sem médico de família comprova a grave crise de capital humano que o SNS tem vivido. “Precisamos de aprofundar a reforma dos cuidados de saúde primários, porque existe aqui um problema grave que é termos cerca de 1,3 milhões de pessoas sem médico de família atribuído. Um dos objetivos dos governos tem sido sempre o de atribuir médico de família a todos os portugueses”, sublinha Miguel Guimarães. Porém, para tal sair do patamar das promessas, “é preciso contratar mais médicos especialistas em Medicina Geral e Familiar e, aí, aplica-se o mesmo princípio inicial que é o de criar melhores condições de trabalho.”
Ainda em relação aos cuidados de saúde primários, Miguel Guimarães atentou que o SNS está a funcionar no sentido oposto àquele que deveria. Os cuidados de saúde primários deveriam ser a porta de entrada dos utentes e não os hospitais, principalmente nos serviços de urgência, como tem acontecido cada vez mais. É clara a premência de avançar com a reforma dos cuidados de saúde primários e dos hospitalares.
“Sabemos que cerca de 40% a 50% das pessoas que recorrem ao serviço de urgência provavelmente não precisariam de o fazer, porque têm situações que não são urgentes. Mas, para isso, é preciso ter uma alternativa, um espaço e disponibilidade para esses utentes serem atendidos nos cuidados de saúde primários”, frisou.
Por fim, sobre o investimento, o bastonário defendeu que este se deverá focar na prevenção e não na “resolução”.
Miguel Guimarães acredita ser necessário criar “um instituto público, ou como lhe queiram chamar, com as funções de promover a saúde, prevenir a doença e, ao mesmo tempo, promover a literacia em saúde”. Principalmente, para assegurar a sustentabilidade do SNS: “andamos a correr atrás do prejuízo e, na verdade, se a população for mais saudável, significa que tem menos doenças e, assim, o SNS não vai ter a pressão que tem”.
“Não temos uma estratégia global, que envolva a educação, que envolva a saúde, entre outras áreas, no sentido de ter pessoas mais saudáveis, que ganhem gosto por fazer exercício físico e percebam a importância disso. E quem acaba por ter mais problemas nesta área são as populações mais desfavorecidas, que são também as que têm mais doenças graves e crónicas”. Assim “as desigualdades sociais, em vez de diminuir, só se agravam”, concluiu.