Miguel Guimarães alerta o Ministério da Saúde e os seus Serviços Partilhados (SPMS) para a grave ofensa à relação médico-doente resultante da penosa disfunção dos sistemas informáticos e da excessiva burocratização que envolve as consultas médicas. “Não só são exigidos aos médicos cada vez mais procedimentos informáticos supérfluos, que só penalizam o tempo destinado a observar os doentes e podem comprometer a qualidade dos cuidados de saúde, como os próprios sistemas e aplicações que nos obrigam a utilizar não funcionam muitas vezes”, alerta o bastonário da Ordem dos Médicos (OM).
“Os danos informáticos infiltram toda a nossa prática clínica, pela raiva que nos provoca o facto de serem estúpidos, injustificáveis, alvo de propaganda desonesta e arbitrários; é que enquanto andamos nisto e bufamos e praguejamos todos os dias frente às aplicações informáticas que não funcionam, não estamos a ser empáticos, não estamos a questionar a nossa própria prática, não estamos a pesquisar fontes de informação credíveis que a sustentem, não estamos a ser criativos, a investigar, a apoiar-nos mutuamente dentro das equipas…”. O desabafo, explica o bastonário, “é de uma colega médica desgastada com os problemas informáticos”.
“Uma vergonha” refere o bastonário, que remeteu ao Ministério da Saúde e aos SPMS um ofício a dar nota das sucessivas falhas nos sistemas informáticos e da cada vez maior burocracia que envolve a utilização dos sistemas e aplicações informáticas.
Em julho, Miguel Guimarães já tinha alertado os mesmos responsáveis políticos, para uma circular normativa emitida pela gestão dos sistemas informáticos das unidades de saúde, na qual integravam mais um procedimento para emissão de receituário que veio aumentar o tempo dedicado ao computador e ao cumprimento de burocracias administrativas, penalizando o tempo útil dedicado ao doente. “Obrigar os médicos, devido às várias falhas informáticas que se repetem no sistema da prescrição da ‘receita sem papel’, a interromper o tempo de consulta para solicitar ao helpdesk um número de suporte que apenas serve para identificar a receita que estão a prescrever na sua versão manual, mostra de forma clara o caminho errado que está a ser seguido”, afirmou então Miguel Guimarães.
“A modernização dos sistemas informáticos devia servir para agilizar e não para comprometer a relação médico-doente”, afirma o bastonário, que condena “a forma negligente com que se está a lidar com a atual situação caótica nos sistemas informáticos”. “As fragilidades constantes do sistema não servem os doentes nem os profissionais de saúde. O que deveria ser um sistema ágil, seguro e eficaz, está a tornar-se um verdadeiro pesadelo”, conclui Miguel Guimarães.
Não estando em causa a evolução tecnológica e informática, as sucessivas falhas no sistema, agravadas pela obrigatoriedade de cada vez mais “passos informáticos”, tornam-se cada vez mais incompatíveis com o exercício da profissão. “Hoje, um médico passa mais de 50% do tempo de consulta ao computador e menos tempo a ouvir e observar o seu doente”, critica Miguel Guimarães. E conclui, “isto é inadmissível e pode obrigar os médicos a seguir um caminho diferente na defesa dos doentes e da qualidade da medicina. Chegou o momento de atribuir responsabilidades técnicas e políticas aos SPMS que se têm revelado incapazes para resolverem a situação”.