Autora: Rosana Andreia Vilar Campos, Médica Interna de MGF (USF Lígios)
Resumo: A Organização Mundial de Saúde define saúde como “estado de completo bem-estar físico, mental e social e não somente ausência de afeções e enfermidades”. Encontra-se consagrado no artigo nº64 da Constituição da República: “que todos têm direito à proteção da saúde e o dever de a defender e promover.” Qual a conduta do profissional de saúde para respeitar o direito em saúde e autonomia individual do doente?
O direito à proteção da saúde é realizado através de um serviço nacional de saúde universal e geral e, tendo em conta as condições económicas e sociais dos cidadãos, tendencialmente gratuito. O cidadão constitui assim um Ser de direitos e deveres no que toca à saúde, cabendo-lhe ser o primeiro responsável pela sua saúde. Deste modo, o doente pede ajuda na defesa da sua integridade física, mas também psicológica, social, moral, espiritual e humana.
É importante relembrar, no que toca à saúde, o direito de autodeterminação. A evolução civilizacional tem colocado o ser humano em primeiro lugar, lutando para que a sua vontade prevaleça. Contudo, na atualidade, a fundamentação dos valores pelos quais se devem nortear as políticas de proteção dos direitos individuais apresenta-se como um dos principais dilemas das sociedades civilizadas. Desde sempre que a sociedade se governa por normas e valores éticos, tentando uniformizar uma atuação perante a complexidade que é o ser humano, principalmente no contexto da saúde. No Código Deontológico, é um princípio geral de conduta o médico exercer a sua profissão de acordo com as “leges artis” com o maior respeito pelo direito à saúde das pessoas e da comunidade. Tem-se, mais do que nunca, uma visão clara sobre a conceção biológica e antropológica da pessoa humana que, como tal, lhe confere a dignidade e o direito a liberdade própria, implicando que a ciência se concentre em criar sempre as melhores condições para a existência da humanidade, respeitando a identidade do sujeito. Isto só é possível com a análise ética das questões, de uma forma imparcial e fazendo-se reger pelos princípios da autonomia, beneficência, não maleficência e justiça, fazendo prevalecer a autodeterminação individual. Ao mesmo tempo que a autonomia individual do doente tem de ter o seu meritório reconhecimento e aceitação, também a ética e a deontologia profissional devem ser analisadas, para que o conjunto de deveres inerentes ao exercício profissional seja executado de acordo com as regras vigentes, mas não infligindo a própria liberdade individual do profissional. Direito à vida, à autodeterminação, à integridade física e moral, ou ao reconhecimento da personalidade são inerentes a todo o ser humano. Sempre que possível, na realização de um ato médico, deve obter-se o consentimento livre e esclarecido, pressupondo que o doente está no pleno uso das suas capacidades mentais, sendo também da competência do profissional obter conhecimento se o paciente, através de qualquer meio, exprimiu a sua opinião ou vontade sobre determinado assunto.
É necessário reconhecer a autonomia do indivíduo e proteger os que têm autonomia diminuída, basear a atuação no respeito incondicional e absoluto pelo ser humano, garantir a privacidade e confidencialidade dos dados, obter o consentimento informado e livre, após informação adequada. O direito à proteção da saúde é, hoje, considerado como uma conquista civilizacional, o que implica que a salvaguarda deste direito seja uma responsabilidade da sociedade e das suas instituições democráticas. O acesso à saúde é essencial para a busca de uma igualdade efetiva de oportunidades numa sociedade livre e inclusiva. Porém, não se pode esquecer que a promoção da saúde deve advir, em primeiro lugar, do próprio indivíduo e da sua família. Valores como a liberdade e a igualdade de oportunidades devem ser devidamente protegidos, de forma a que a saúde não seja considerada apenas como um bem individual, mas sim como um compromisso com o investimento social.
Conhecer e exercer os direitos e deveres representa uma das formas mais importantes de defesa da saúde, além de permitir uma melhoria progressiva dos cuidados e serviços, contribuindo para a sua humanização e colocando o cidadão como a figura central de todo o sistema. O desenvolvimento de um bom relacionamento entre doentes e profissionais de saúde, procurando estimular a participação ativa do doente pretende reafirmar os direitos humanos fundamentais na prestação de cuidados de saúde, sobretudo, protegendo a dignidade e integridade humanas. A História mostra o amadurecimento dos conceitos de saúde, direito e dignidade humana e revela que o homem procura sempre encontrar o melhor para si próprio, investindo em conhecimento e organização, na procura do maior interesse do cidadão e melhor prestação de cuidados.
Bibliografia:
Decreto-Lei nº 48/90, de 24 de agosto de 1990. Diário da República, 1ª série, N.º 195. Ministério da Saúde. Lisboa.
Nunes R; Nunes S; Rego G. Health care as a universal right. J Public Health. 2016.
Rego G; Brandão C; Melo H; Nunes R. Distributive Justice and the Introduction of Generic Medicines. 2002. Health Care Analysis 10: 221–229