Informação
Na sequência da divulgação do Relatório e respetivas conclusões elaborado por uma Comissão de Inquérito/Avaliação designada para realizar uma auditoria aos Cuidados Clínicos prestados aos utentes do Lar da FMIVPS em Reguengos de Monsaraz devido ao surto COVID-19 tem vindo a ser publicamente posta em causa a competência da Ordem dos Médicos para este efeito.
Importa, por isso, esclarecer definitivamente esta questão.
Para tanto e a breve trecho, diga-se que a Ordem dos Médicos é uma associação pública profissional, cujos estatutos constam do Decreto-Lei n.º 282/77, de 5 de Julho, na versão aprovada pela Lei n.º 117/2015, de 31 de Agosto, diploma legal a que pertencem os artigos que se mencionarão e que será designado por EOM.
Releva também que, muito sumariamente, se percebam os conceitos de “atribuições” e de “competências”.
Assim, as atribuições correspondem ao conjunto de fins de interesses público que a lei coloca a cargo de uma pessoa coletiva pública, correspondendo as competências ao conjunto dos poderes atribuídos pela lei a cada um dos órgãos da pessoa coletiva. O exercício das competências dos órgãos destina-se a prosseguir as atribuições da pessoa coletiva pública em que se integram sendo, portanto, poderes funcionais.
Na linguagem comum esta distinção não é usual, sendo utilizada a palavra “competência” para designar ambas as realidades, como se fossem sinónimos.
Ora, as atribuições da Ordem estão definidas no artigo 3.º[1] do EOM, ali constando expressamente que lhe cabe “contribuir para a defesa da saúde dos cidadãos e dos direitos dos doentes”. Este é, portanto um fim de interesse público que a OM tem de prosseguir através dos seus órgãos.
A constituição da Comissão de Inquérito foi deliberada pelo Conselho Regional do Sul, ao abrigo do artigo 38.º, n.º 1, alínea e) e pelo Conselho Nacional, órgão com competência para o efeito, de acordo com o artigo 58.º, n.º 1, alínea s).
Mais ficou definido que a Comissão, em articulação com o Conselho Nacional para a Auditoria e Qualidade, tinha por objetivo a realização de uma auditoria aos cuidados clínicos prestados aos utentes do Lar da FMIVPS em Reguengos de Monsaraz devido ao surto COVID-19.
Por seu turno, este Conselho Nacional para a Auditoria e Qualidade, previsto no artigo 91.º[2], tem expressamente a competência para participar nas auditorias da qualidade realizadas no território nacional.
Do exposto resulta que a Ordem dos Médicos agiu no quadro das suas atribuições e competências, sendo falsas as afirmações que têm vindo a ser propaladas de que esta entidade não tem “legitimidade” ou não tem “competência” para avaliar a prestação de cuidados clínicos, como o fez na situação em causa, auditando a sua qualidade e as condições em que foram prestados.
A Ordem dos Médicos tem assim competência legal para fazer auditorias à qualidade da prestação dos cuidados clínicos e, como o Senhor Primeiro-Ministro deveria saber, tem mais competências que agora não lhe interessam referir como seja aquela que há muitos anos exerce ao aferir a idoneidade e capacidade formativa médica dos estabelecimentos do SNS, entre outras.
Se o Primeiro-Ministro quisesse fazer uma leitura objectiva do relatório da Ordem dos Médicos não teria dificuldade em perceber que não se trata de um relatório de vistoria fundado em poderes fiscalizadores mas sim de uma auditoria à prestação de cuidados de saúde num determinado período no Lar da FMIVPS de Reguengos de Monsaraz.
Mas mais do que a abordagem formal, que como se viu está correta, importa mais aquilo que se apurou e que são factos gravíssimos num quadro real em que se registaram 18 mortes em condições inadmissíveis no nosso país.
O departamento Jurídico da Ordem dos Médicos
Lisboa, 23 de agosto de 2020.
[1] Artigo 3.º
Atribuições
1 – São atribuições da Ordem:
a) Regular o acesso e o exercício da profissão de médico;
b) Contribuir para a defesa da saúde dos cidadãos e dos direitos dos doentes;
c) Representar e defender os interesses gerais da profissão;
d) Conceder o título profissional e os títulos de especialização profissional;
e) Atribuir prémios ou títulos honoríficos;
f) Elaborar e atualizar o registo profissional;
g) Exercer o poder disciplinar sobre os médicos, nos termos do presente Estatuto;
h) Prestar serviços aos médicos, no que respeita ao exercício profissional, designadamente em relação à informação e à formação profissional;
i) Colaborar com as demais entidades da Administração Pública nas questões de interesse público relacionadas com a profissão médica;
j) Participar na elaboração da legislação que diga respeito ao acesso e exercício da profissão médica;
k) Participar nos processos oficiais de acreditação e na avaliação dos cursos que dão acesso à profissão médica;
l) Reconhecer as qualificações profissionais obtidas fora do território nacional, nos termos da lei, do direito da União Europeia ou de convenção internacional;
m) Organizar eventos de caráter científico, cultural e recreativo;
n) Atribuir prestações de solidariedade aos médicos carenciados, através do Fundo de Solidariedade;
o) Prosseguir quaisquer outras que lhe sejam cometidas por lei.
2 – A Ordem está impedida de exercer ou de participar em atividades de natureza sindical ou que se relacionem com a regulação das relações económicas ou profissionais dos seus membros.
[2] Artigo 91.º
Conselho nacional para a auditoria e qualidade
Compete ao conselho nacional para a auditoria e qualidade:
a) Emitir parecer sobre os assuntos relacionados com auditoria e qualidade na saúde;
b) Participar, com os colégios da especialidade, na elaboração de normas de orientação clínica;
c) Participar nas auditorias da qualidade realizadas no território nacional;
d) Participar na definição de indicadores de qualidade em saúde;
e) Promover a formação na área de auditoria em saúde.