Estimados Colegas,
Independentemente da nossa especialidade ou do setor onde trabalhamos, a nossa principal missão como médicos foi e será sempre servir a causa pública, os cidadãos, os doentes. Seja na promoção da saúde e prevenção da doença, ou no diagnóstico, reabilitação e tratamento de doentes. Cuidar dos doentes, dar-lhes qualidade e anos de vida, salvar vidas, uma nobre missão que torna a nossa profissão especial e única.
É indiscutível o papel essencial que tivemos ao abrir caminho para a criação do nosso serviço público de saúde, tendo-se tornado o Serviço Nacional de Saúde (SNS) numa marca de sucesso da nossa democracia. Construímos o sistema de saúde em Portugal e continuamos a fazê-lo funcionar todos os dias e, em particular, o SNS. Nesta altura em que enfrentamos o surto do novo coronavírus (COVID-19), escrevo-vos evocando o nosso passado e presente, apelando à vossa colaboração direta neste desafio de saúde pública internacional, considerado pela OMS uma emergência. As minhas palavras, e o apelo que vos deixo, têm uma relevância especial para os médicos que já saíram do SNS, nomeadamente, os reformados, mas também para os médicos que, estando a trabalhar no SNS, possam dar um contributo adicional, caso venha a ser necessário.
Do serviço médico à periferia à criação dos internatos médicos, passando pelas carreiras médicas, muitos têm sido os momentos em que definimos a estratégia e a liderança do SNS e que permitiram que nele assegurássemos um eixo de coesão social essencial num Portugal europeu e moderno. Um eixo sempre apoiado na ciência, na experiência e na inovação, mas sem esquecer a importância de saber cuidar.
Ser médico é estar na linha da frente nos momentos difíceis e tentar influenciar favoravelmente o rumo dos graves problemas que assolam a nossa população, com espírito de solidariedade e grande sentido humanista para com a nossa sociedade e, acima de tudo e sempre, para com os nossos doentes.
É por isso que me dirijo a todos vocês num momento em que o mundo atravessa uma emergência de saúde pública internacional de risco “muito elevado”, crise que também atinge o nosso país, sobre a qual ainda há dados incipientes, mas em que estamos certos que, com tranquilidade, todos podemos ter um papel a desempenhar para minimizar o seu impacto.
Sabemos que o SNS foi alvo de grande desinvestimento ao longo dos últimos anos, perpetuado por sucessivos governos, e que nos conduziu a um estado de carência ao nível das infraestruturas, equipamentos e capital humano. A sua capacidade de resposta está comprometida e enfraquecida e, por isso, o surgimento do novo coronavírus já está a representar uma pressão acrescida difícil de gerir – e pode mesmo vir a tornar-se extraordinariamente difícil.
Considero que este é um momento importante de união entre todos os cidadãos e, em especial, entre todos os médicos e profissionais de saúde. É o momento de colocar as divergências de lado e centrar os nossos esforços em servir a verdadeira causa pública que são as pessoas e o país, e ajudar a Autoridade de Saúde Nacional (DGS) e o Governo a garantir uma resposta adequada ao evoluir da situação epidémica.
Por isso, escrevo-vos estas linhas, para mais uma vez apelar ao espírito solidário e humanista que representa ser médico, dirigindo-me a todos os médicos, mas também muito em especial aos médicos que já saíram do SNS, para que neste momento de crise, e caso a situação se venha a agravar (o que é altamente expectável), considerem a possibilidade de estarem disponíveis para ajudar Portugal, e voltar a trabalhar temporariamente, na medida do possível, no serviço público para que o país possa responder ao acréscimo de procura que o COVID-19 poderá representar. Cada médico poderá dar o seu contributo na sua área de conforto e saber, libertando outros médicos, mais especializados, para que possam dar o seu contributo específico na área do COVID-19. Aos que já fazem o SNS todos os dias, em condições muito difíceis, só posso agradecer antecipadamente o esforço extra que estão a fazer, e para o qual sei que estão à altura.
Tenho a certeza de que os portugueses têm total confiança em nós e esperam que sejam os médicos, como já aconteceu noutras circunstâncias, a liderar e encontrar soluções para ultrapassar esta fase excecionalmente difícil. E não os podemos dececionar.
Estamos, ao mesmo tempo, em contacto e a pressionar a DGS e o Ministério da Saúde para garantir que os profissionais de saúde tenham acesso aos equipamentos de proteção adequados e, nomeadamente ao equipamento de proteção individual para se resguardarem durante o contacto com potenciais doentes e doentes infetados.
Tenho um enorme orgulho em ser médico. E um orgulho imenso em todos os médicos.
Conto com todos e cada um de vós. Muito obrigado.
Peço a todos os médicos que possam estar disponíveis para reforçar a capacidade de resposta dos nossos serviços de saúde nesta fase crítica, que se pode vir a agravar de forma considerável, que se inscrevam desde já, preenchendo todos os dados solicitados e autorizando a partilha destes dados para posterior contacto do Ministério da Saúde/DGS.
Bem hajam.
Com afeto e respeito,
Bastonário da Ordem dos Médicos
Comissão Permanente Conselho Nacional da OM