DEPARTAMENTO JURÍDICO
ASSUNTO: NORMAS DE APTIDÃO FÍSICA E MENTAL PARA CONDUÇÃO DE VEICULO A MOTOR
INFORMAÇÃO
Foi presente a este Departamento uma comunicação de um médico, na qual solicita esclarecimentos a diversas dúvidas que a leitura do D.L. 45/2005, diploma que aprovou o novo modelo da carta de condução, lhe suscitou.
Em síntese útil, os aspectos focados pelo Doutor … são os seguintes:
1. Interpretação do art.º 4.°, conjugado com o art.º 10.° do D.L. 45/2005 – data de validade das cartas emitidas e quando deverão ser revalidadas;
2. No caso dos condutores do Grupo 1, qualquer médico pode emitir o atestado. Se o médico assistente recusar a emissão desse atestado após o exame, o examinando poderá ir a outros médicos, até encontrar quem emita o dito atestado, eventualmente por desconhecer uma patologia de que o examinando padece e que por este é ocultada;
3. No caso dos condutores do Grupo 11, se a Autoridade de Saúde recusar a emissão de atestado não está previsto qualquer recurso.
4. É suficiente um exame médico baseado em dados objectivos e história colhida para emitir o atestado ou será mandatório o recurso a exames complementares de diagnóstico e quais deverão ser os obrigatórios? Será necessário colher a informação de especialistas das diversas áreas e em que casos?
5. Quais os meios que existem, nos casos em que o atestado não “reprova” o examinando mas antes impõe restrições/condições, tais como um controlo médico da doença detectada, para fiscalizar o cumprimento dessas condições?
Antes de mais importa esclarecer que o D.L. 45/2005 foi já alterado pelo D.L. 103/2005, de 24 de Junho, estando por esta via clarificadas muitas das questões suscitadas.
Por outro lado e sendo certo que se mantêm em vigor, embora transitoriamente, as normas do Decreto-Lei N.° 209/1998, de 11 de Julho, com as alterações introduzidas pela Lei N° 2111999, de 21 de Abril, e pelo Decreto-Lei N° 315/1999, de 11 de Agosto, este Departamento elaborou uma informação genérica cuja cópia se junta.
Mas apreciemos, concretamente, as questões enunciadas pelo Doutor … .
No que respeita à validade das cartas de condução já emitidas (situação enunciada sob o n.º 1), verifica-se que as modificações introduzidas pelo D.L. 103/2005 no articulado do D.L. 4512005 tornaram mais simples e clara a interpretação das normas vigentes relativas a esta questão.
Vejamos o teor dos artigos do D.L. 45/2005, com a redacção introduzida pelo D.L. 103/2005, que versam sobre esta matéria:
Artigo 4.° Validade
1 – A habilitação titulada pelas cartas de condução é válida pelos períodos nelas averbados.
2 – O termo de validade das habilitações tituladas pelas cartas ocorre nas datas em que os seus titulares perfaçam as idades seguintes:
a) Condutores de veículos das categorias A, B e B+E, da subcategoria A1, B1 – 50, 60, 65, 70 e, posteriormente, de dois em dois anos;
b) Condutores de veículos das categorias C e C+E e das subcategorias C1 e C1+E – 40, 45, 50, 55, 60, 65 e, posteriormente, de dois em dois anos;
c) Condutores de veículos das categorias D e D+E e das subcategorias D1 e D1+E- 40, 45, 50, 55, 60 e 65.
3 – Só podem conduzir automóveis das categorias D e D+E e ainda da categoria C+E cujo peso bruto exceda 20.000 kg os condutores de idade até 65 anos.
4 – O disposto no n° 2 não prejudica a imposição de períodos de validade mais curtos, determinados pela necessidade de o condutor se submeter a exames médicos ou de observação psicológica que lhe tenham sido impostos pelas entidades competentes.
5 – O titular de carta de condução emitida antes da entrada em vigor do presente diploma mantém a habilitação até que ocorra o primeiro termo de validade, nos termos das alíneas do n° 2.
Artigo 5.° Revalidação
1 – A revalidação das cartas de condução efectua-se mediante entrega pelos seus titulares, no serviço competente da Direcção-Geral de Viação, de comprovativo médico da sua aptidão física e mental, nos termos definidos em regulamento, nos seis meses que antecedem o termo da sua validade.
2 – Sempre que para a obtenção dos títulos de habilitação de conduzir das categorias e subcategorias previstas no Código da Estrada seja exigido relatório de exame psicológico favorável, o mesmo é também exigido para a respectiva revalidação.
Artigo 10° Entrada em vigor
1 – O presente diploma entra em vigor 90 dias após a data da sua publicação.
2 – Sem prejuízo do disposto no número anterior, o actual regime de validades de cartas de condução mantém-se em vigor até 1 de Janeiro de 2008 para cartas emitidas antes da entrada em vigor do presente diploma.
Do teor das normas transcritas, resulta claro que, no que respeita às cartas emitidas antes da entrada em vigor do D.L. 45/2005, as mesmas mantém o actual regime de validade até 1 de Janeiro de 2008.
Posteriormente a essa data, as cartas devem ser renovadas no momento em que ocorra o primeiro termo de validade, isto é, se a data que consta do título como prazo de validade terminar antes de qualquer um dos enunciados nas diversas alíneas do n.º 2 do art.º 4.°, será essa a data relevante; se a situação for a inversa, ou seja, se o titular da licença completar uma das idades previstas nas alíneas indicadas antes da data indicada na carta, deverá proceder à revalidação nessa altura. Aliás, tal como resulta das regras de revalidação do título, os condutores devem proceder à entrega dos documentos necessários à dita revalidação seis meses antes do termo do prazo de validade.
Este é o regime que resulta da conjugação do n.o 5 do art.º 4.° com o n.º 2 do art.º 10.°.
No que concerne à situação descrita sob o n.º 2 cremos que o Doutor … está equivocado.
Com efeito, do n.º 2 do art.º 9.° do D.L. 45/2005 resulta claramente (e já resultava antes da modificação da sua redacção pelo D.L. 103/2005, embora de forma menos explícita) que se mantém em vigor as normas do D.L. 209/98 (considerando as modificações que lhe foram introduzidas por diversos diplomas legais) e do Regulamento da Habilitação Legal para Conduzir por este aprovado.
Ora precisamente o art.º 7.°, n.º 2 do dito Regulamento dispõe que “Quando, em inspecção normal, o examinando não possa ser aprovado nos termos do artigo anterior; surjam dúvidas sobre a sua aptidão física, mental ou psicológica ou se verifique motivo para submissão a exame psicológico, o médico deve relatar essas circunstâncias em boletim de inspecção e enviá-lo, no prazo de quarenta e oito horas, á autoridade de saúde da área de residência daquele.”
Desta norma resulta que o médico, independentemente do regime em que o faça, que examine uma pessoa integrada no Grupo 1 e a quem entenda não dever emitir o atestado, está obrigado a preencher o boletim de inspecção e a remetê-lo à Autoridade de Saúde no prazo de 48 horas.
Assim, mesmo que o examinando ande de médico em médico até encontrar aquele que emita o atestado, não logrará eximir-se à realização de exame por parte da mencionada Autoridade de Saúde.
Quanto à situação constante do n.º 3, verificam-se os mesmos pressupostos referidos a propósito da questão anterior: o recurso está previsto no Regulamento da Habilitação Legal para Conduzir.
Já no que atine com a situação exposta sob o n.º 4 e embora os pressupostos mencionados supra dêem resposta ao médico, importa tecer algumas considerações.
Em conformidade com as normas e princípios constantes do Código Deontológico, o médico é independente e autónomo no exercício da sua profissão, devendo agir de acordo com a sua ciência e consciência.
Isto significa, salvo melhor opinião, que no caso aqui em apreço, em que está em causa a emissão de um atestado de aptidão física e mental para a condução de veículos a motor, o médico deve socorrer-se dos meios que entender necessários, face à pessoa concreta que lhe pede o dito atestado. Se considerar ser fundamental o parecer de médicos especialistas em determinadas áreas, cabe-lhe informar o examinando dessa circunstância e proceder às diligências necessárias para que este obtenha tais pareceres.
E o mesmo ocorre relativamente aos meios complementares de diagnóstico.
Tudo isto sem que seja necessário que a lei estabeleça concretamente a possibilidade do médico recorrer ao parecer de outros especialistas ou a meios complementares de diagnóstico, porquanto tal poder decorre do seu próprio estatuto enquanto médico.
Acresce que, como regra geral, a carta de condução não deve ser emitida ou renovada a qualquer candidato ou condutor que sofra de uma doença não mencionada no Anexo III ao D.L. 45/2005 e que seja susceptível de constituir ou provocar uma incapacidade funcional de natureza a comprometer a segurança rodoviária quando da condução de um veículo a motor.
Ou seja, as normas que indicam as patologias e condições específicas que conduzem à não emissão do atestado não são taxativas, no sentido de serem as únicas aptas à produção daquele efeito, pelo que mesmo que os médicos optem, neste tipo de situações, pela aplicação de protocolos de actuação, estes não os eximem de responsabilidades.
Conclui-se, pois, quanto a este aspecto no sentido de que cabe ao médico, face à pessoa concreta que examina, determinar quais os exames e pareceres que devem ser pedidos, pois tal decorre da sua independência e autonomia.
Por último e no que respeita à questão n.º 5, importa desde já dizer que não é responsabilidade do médico a fiscalização das situações em que o condutor deve seguir um regime específico de condições de controlo de doença para manter válida a sua licença de condução.
Nas situações em que tal ocorra haverá um averbamento próprio na carta de condução, cabendo ao condutor respeitar as condições que lhe foram impostas e munir-se dos documentos necessários (v.g. um atestado que comprove o controlo da doença em determinada data).
Sem prejuízo do que ficou dito, sublinha-se contudo que neste âmbito as obrigações dos médicos são aquelas que constam do n.º 3 do art.º 12 do Regulamento da Habilitação Legal para Conduzir, que passamos a transcrever:
3 – Os médicos que, no decorrer da sua actividade clínica, tratem condutores que tenham sido atingidos por doença ou deficiência, crónica ou progressiva, ou detectem perturbações do foro psicológico susceptíveis de afectar a segurança na condução devem aconselhá-Ias a solicitar inspecção especial à autoridade de saúde da área da sua residência e notificar do facto aquela autoridade, sob a forma de relatório clínico fundamentado e confidencial.
Eis pois o que se nos oferece dizer face à exposição do Doutor … .
O Consultor Jurídico
Paulo Sancho
2005-10-27