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Luís Alberto Machado Luciano(1935-2021)

    Homenagem

    Homenagem ao Dr. Luís Machado Luciano

    (Ex) Diretor do Serviço de Cirurgia Geral do CHS

     

    O Dr. Luís Alberto Machado Luciano, foi um dos pioneiros e obreiros do Serviço de Cirurgia Geral do Hospital de S. Bernardo, hoje Centro Hospitalar de Setúbal.

    Aquando da sua chegada a Setúbal, juntamente com outros cirurgiões, o Hospital S. Bernardo tinha dois cirurgiões, os quais eram, nessa altura, insuficientes para responder às solicitações duma população em crescimento e à transposição do conhecimento existente nos Hospitais Centrais de Lisboa, onde se impunha a criação de um serviço com as características daqueles hospitais. Na tradição da chamada “Escola dos Hospitais Civis de Lisboa”, o Dr. Machado Luciano soube implementar um serviço de cirurgia, respondendo à procura da comunidade e pelo prestígio angariado,  conseguiu atrair várias gerações de jovens que se formaram e tornaram Cirurgiões no seu serviço.

    Muitos de nós, seus Internos, ainda no activo neste serviço, demos os primeiros passos e crescemos na cirurgia geral através dos seus ensinamentos e ajuda. Com Ele e sob o seu incentivo e coordenação aprendemos a elaborar as nossas primeiras comunicações orais em Congressos Nacionais e Internacionais. A sua preocupação com a formação médica, levou-o a ser um dos cofundadores, Presidente e dinamizador, durante décadas, da Sociedade dos Hospitais Distritais da Zona Sul. Tal, permitiu um intercambio entre os médicos de várias especialidades dos hospitais desta zona, o que se traduziu num desenvolvimento científico ímpar, até aí, restrito aos Hospitais Centrais.

    Com Ele e outros da sua geração, aprendemos os primeiros gestos cirúrgicos, mas antes de tudo, a avaliar os doentes, nunca esquecendo em todos os momentos, os aspectos humanitários e culturais de cada um, ou seja, tratar as pessoas como doentes e não como utentes ou clientes.

    O Dr. Luciano, sempre nos apoiou, quando duma forma natural e acompanhando o desenvolvimento tecnológico e científico, foram introduzidas novas abordagens e técnicas no seu serviço, Saliento, a introdução da Cirurgia Laparoscópica e Endorectal em que o Centro Hospitalar de Setúbal foi pioneira em Portugal.

    Em todos as nossas fases de crescimento como Cirurgiões, sempre se prontificou a ajudar e ensinar-nos a resolver diversas situações cirúrgicas, só ao alcance dum Cirurgião conhecedor da Leges Artis  e com vasta experiência pessoal.

    Por tudo isto e muito mais que fica por escrever, deixamos em nome do Serviço de Cirurgia Geral do CHS, a nossa gratidão e empenho em manter a identidade do serviço criada pelo Dr. Luis Machado Luciano.

    Ass: Luis Cortez, Vitor Rigueira, Rosário Eusébio, José Pedro Fontinha, Vitor Rocha, Pedro Santos Ferreira, Sofia Cuco Guerreiro, Henrique Candeias, Luis Branco, Aurora Pinto, Manuel Morales, Sofia Rufino, Elga Paixão, Joana Almeida, Carlos Trindade e Ana André

    Luís Alberto Machado Luciano – Um Cirurgião dos “Civis”, que na gíria significava um Cirurgião de “mão cheia

    Em 1972, depois de concluída a formação em Cirurgia Geral, nos Hospitais Civis de Lisboa, o Dr Luciano (como nós, seus Internos, o tratavam), veio por concurso e opção para o Hospital da Misericórdia de Setúbal (Hospital antigo) e mais tarde chamado Hospital Distrital de Setúbal (Hospital de S. Bernardo).

    Um profissional de saúde de desafios e de “visão“

    Por opção deixou um Hospital Central para vir trabalhar para um Hospital Distrital, contrariando e desafiando o que era habitual… mas acreditando que poderia ser mais útil ao próximo e também ao futuro da Instituição que escolheu.

    O Futuro dos Hospitais Distritais…

    O 25 de Abril de 1974, como importante marco da alteração organizativa e de objetivos, para os hospitais na periferia dos grandes centros, transformou-o num agente entusiasta para a mudança. Integrou várias Comissões Instaladoras (1974-1976) e na qualidade de Diretor de Serviço, contribuiu ativamente para a Formação pós-graduada na área da Cirurgia Geral, dos jovens médicos colocados nos novos Hospitais Distritais nas áreas do Internato Geral e da Especialidade.

    Foi um dos fundadores e dinamizadores da Sociedade Médica dos Hospitais Distritais da Zona Sul, que muito contribuiu para a evolução e acreditação dos Hospitais Distritais, assim como na formação continua dos Médicos.

    Um Homem da Comunidade e da cultura

    Entre 1999 e 2003 presidiu a Assembleia-geral da Distrital de Setúbal, da Ordem dos Médicos, em dois mandatos sucessivos.

    Desempenhou funções como presidente da Assembleia-geral da Setúbal-Polis 2001 a 2005.

    Exerceu as funções de presidente do Conselho Consultivo da Liga dos Amigos do Hospital São Bernardo (LAHSB) e na presidência do Conselho Fiscal da – Liga de Apoio Comunitário para o Estudo das Doenças Infeciosas (LACPEDI).

    Foi Presidente da Liga dos Amigos de Setúbal e Azeitão (LASA), por dois mandatos.

    Machado Luciano ainda viu a sua atividade ligada à saúde, mas também à vida cívica e social, ser distinguida em 2018 pela Câmara de Setúbal, com a Medalha da Cidade na categoria de Ciência e Tecnologia.

    A sua relação com todos, caracterizada pela cordialidade, bonomia e apurado sentido de humor, para além da competência profissional e espírito de iniciativa, facilmente o transformaram num elemento prestigiado, dentro e fora da Instituição.

    Dos seus “Internos” e Amigos

    Álvaro Pacheco, Manuel Carvalho e Luís Mendonça

     

    Luís Alberto Machado Luciano – gratidão, uma dor enorme, saudade até ao fim.

    Tão inesperadamente como uma nova agilidade a juntar às que lhe conhecíamos, desapareceu Machado Luciano. Uma dor pesada e paralisante.

    Como ser humano, médico e cirurgião, em qualquer destas dimensões, tinha uma notoriedade que o fazia destacar; mas a exibição não o

     

    seduzia e trocou a sobranceria por uma presença discreta que o fazia parecer um homem comum. Era o que desejava: ser social e próximo dos outros. Não seguia estereótipos. Embora comunicativo, extrovertido e participante, era difícil decifrar uma coerência que definisse alinhamentos. Sempre atido a uma independência que por vezes lhe saiu cara, pagou o tributo com uma coragem discreta, solitária e sem queixume. Em contrapartida, com a mesma coragem, saltava para a praça pública e botava na escrita a defesa das causas e dos amigos injustiçados. Mais do que tudo, era a afabilidade que prezava, a proximidade e, de modo mais vasto, a civilidade, que nunca esteve ausente do seu pensamento e postura. Era assim com as pessoas em geral e era assim nas relações de trabalho. Por isso também, é impressionante a generalidade dos que simpatizavam com ele, o apreciavam, admiravam, e até dos que se sentiam seduzidos pela sua presença, pelo seu humor e pelas gargalhadas que, mesmo já velho, lhe davam uma expressão inocente, quase infantil.

    Uma grande vivacidade na clínica. Sensibilidade para os sinais e para a imediata conjugação de toda a informação que conduzia ao diagnóstico. Uma economia de meios que é suprida por esta eficácia hipocrática que retira substância do sensível e do conhecimento empírico. Depois, a integração numa racionalidade bem organizada e com a clareza do que é simples. A mesma prontidão e a mesma economia de gestos que preserva o tecido e previne as complicações na cirurgia de exérese e amputação. Agressões violentas para os doentes, sabia minimizá-las com a delicadeza da manipulação e a eficácia do gesto preciso que sorvia o supérfluo e abreviava o tempo. Do conjunto, retirava-se beleza e graciosidade para marcar um estilo e sugerir arte.

    Viajante incansável pelos hospitais deste país, de Beja e Faro até ao Porto, Barreiro, Portalegre e Lisboa, não faltava a um acontecimento, uma reunião, um congresso, onde as ideias se ventilam, os colegas se encontravam, e o progresso se insinua. Também a oportunidade de conviver e comunicar, onde o riso nunca esteve ausente. Não sendo um estudioso profundo, era reflexivo e estava à vontade em toda a parte e em toda a circunstância. Nunca se atrapalhou, participava sempre e quando chegava a sua vez, o humor andava no ar, sem alarde, discreto, mas cheio de intenção — mais saboroso assim.

    Vizinhos de gabinete durante anos e dirigindo serviços idênticos, que poderiam ter sido concorrentes, nunca houve um conflito ou disputa estéril, com prejuízo para a instituição. Numa ou outra ocasião consultei-o e pedi conselho sobre casos clínicos mais difíceis, respeitantes a doentes à minha responsabilidade. Sempre disponível, acompanhava-me à enfermaria, junto do doente. Ajudou-me de forma desinteressada e respondeu de um modo surpreendente, pedindo-me colaboração na sala de operações. Sabia ser dispensável:  tratou-se apenas de uma cortesia de retribuição. Não me devia nem lhe foi pedida. Era uma pessoa notável e um cirurgião de primeira água. Se o orgulho deve ser questionado, que se conceda esta reconfortante vaidade de ter sido seu par. Machado Luciano – gratidão, uma dor enorme, saudade até ao fim.

                                                                                         Joaquim Barradas

                                                                              Chefe de Serviço de Cirurgia (apos.)

    Setúbal, 12 janeiro 2021

    Datas

    Nome completo: LUÍS ALBERTO MACHADO LUCIANO
    Cédula :   9747
    Especialidade: CIRURGIA GERAL
    Data de nascimento: 18/01/1935
    Data de formatura: 19/12/1961
    Faculdade: UNIVERSIDADE DE LISBOA
    Data de inscrição na OM: 23/12/1961
    Data de falecimento:  11/01/2021

    Nota: a OM assegura aos herdeiros os direitos de acesso, retificação e apagamento destes dados pessoais.

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