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Estudo da lista – A experiência de uma interna de MGF

Autora: Ana Raquel Oliveira, Interna de 3º ano de Medicina Geral e Familiar

 

Resumo:

Neste artigo revelo as dificuldades sentidas na elaboração do estudo da lista, fazendo uma reflexão sobre as hipóteses de melhoria e os benefícios que traria a curto e a longo prazo a simplificação deste processo. É uma chamada para a ação para os peritos que organizam as plataformas de exportação de dados e as aplicações informáticas, para uma melhor funcionalidade, ajustada à necessidade do utilizador

O estudo da lista é um documento médico, que tem como objetivo caracterizar a população de uma lista de utentes, em relação a parâmetros clínicos/demográficos específicos, que de certa forma sistematizem aquele utente, e todos os outros, e orientem a organização da agenda e formação médica, das valências da unidade de saúde, da educação para a saúde, dos rastreios, etc. Muitas vezes são usadas amostras da lista de utentes para este efeito.

Não é difícil imaginar o valor deste documento. Esta ferramenta, sim, ferramenta, uma vez que apoia o médico no seu exercício profissional, é também usada para testar o médico sobre o conhecimento da sua lista e acerca da sua progressão na carreira. É parte elementar do currículo médico e, foi nesse contexto, que me deparei com ela pela primeira vez. A primeira impressão foi de desalento. Listas de 1700 a 1900 utentes, informação infindável, tempo disponível não assistencial mínimo, e noção do potencial e importância de semelhante ferramenta, máxima.

Então por onde começar? Felizmente a codificação dos diagnósticos pela ICPC-2, surge como uma vantagem. Já não é preciso percorrer todas as notas de registo médico para encontrar a informação pretendida, felizmente estas notas são também já informatizadas (deixou de ser necessário descodificar os manuscritos), justamente porque os problemas estão codificados. O passo seguinte passa por usar as aplicações que permitem a exportação e análise destas codificações – o SINUS® permite a exportação da lista total dos utentes por médico de família e dispondo ainda de dados demográficos (morada, telefone e número de SNS e número operacional), o MIMUF® e o SIARS® permitem para além da exportação da lista de utentes, a recolha dos utentes por código de diagnóstico, algumas biometrias, algumas prescrições e alguns atos. Nada mau.

Os problemas começaram quando percebi que nem todos os profissionais sabiam como manusear estes programas de forma prática e eficaz e quando procurei os manuais de ajuda para a sua utilização, não tive esta tarefa facilitada, reforçando o problema anterior. Sem tempo a perder, procurei uma solução, experimentando, tentativa-erro, descobrindo então como usar estas aplicações. Como já estamos habituados, muitas foram as vezes em que esta opção me foi barrada logo, pela inatividade da aplicação. Com alguma paciência e treino, fiquei satisfeita com a recolha de alguns dados, simples, que se agregados em Excel® (associando diferentes listagens numa base de dados maior) facilitavam o estudo da lista.

No entanto, durante todo este processo, eu não pude deixar de pensar que, se vivemos na era das tecnologias de informação, e se todos os gestos da consulta são agora replicados de alguma forma, para estas aplicações – sobretudo o SClinic®, porquê limitar o acesso a listas de códigos? Porque não dar ao utilizador a liberdade de combinar as variáveis que ele bem entenda importantes? E os resultados dos exames complementares de diagnóstico, os dados do exame objetivo, as prescrições ou as notas livres? Será assim tão difícil, a possibilidade de carregar numa tecla que dê a evolução daquela lista de doentes, em relação aos programas ativos ou a um problema específico ou até a uma lista de problemas? Ou seja, que mais do que resultados de indicadores e de produtividade do médico e da USF, nos permita realmente caracterizar o doente, auxiliando o médico no conhecimento da sua lista, para assim também ele saber a melhor estratégia para melhorar os indicadores e em suma a sua produtividade. Todos os dias, introduzimos tanta informação valiosa para o utente, para o médico e para a saúde pública nas aplicações informáticas (com o maior ou menor prejuízo que já conhecemos para o utente e para a consulta), o valor deste conteúdo é inestimável. Porquê haver limites de acesso à informação quando já estão asseguradas as medidas de segurança e confidencialidade dos dados dos utentes – utilizadores e a informação está já na rede?

Certamente que todos os médicos de família gostariam que, para o estudo da lista e para uma caracterização mais completa dos utentes, não fosse necessário recolher informação individual e manualmente, processo a processo, ainda que eletrónico. Certamente também, seriam gastas menos horas de trabalho na elaboração deste documento e que reduziríamos também a hipótese de erro na recolha de dados. Certamente que menos doentes ficariam esquecidos. Certamente que haveria mais trabalhos de investigação usando listas de utentes de maior validade científica.

E se tal não for possível, então, para onde vai a informação que diariamente introduzimos nos programas ativos, nos exames complementares de diagnóstico, se de lá não a conseguimos extrair? Parece-me haver neste tema um potencial ainda por explorar, sem menosprezar todos os avanços até hoje, certamente que todos os médicos de família beneficiariam de um programa mais direto, abrangente e simplificado, direcionado para a caracterização do doente, para além da produtividade do médico. O tempo despendido com atuação não-clínica (não assistencial) deveria ser o menor possível e essa realidade está cada vez mais perto. Temos que ser mais ambiciosos, juntar os peritos na área e estudar a melhor forma de aceder e de organizar a informação disponível nas plataformas existentes.